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“Se ausentar deste momento será um erro gravíssimo”

Conversamos com o presidente da Federação dos Bancários da Bahia e Sergipe, Hermelino Souza Meira Neto, sobre as perspectivas para a Campanha Nacional 2018 e os desafios para a categoria bancária.

A Campanha Nacional de 2018 vem marcada por um cenário político nacional de fortes ataques aos direitos trabalhistas. Qual será o principal desafio da categoria diante disso?

Essa Campanha Nacional será diferente de todas as outras. Nós vamos entrar nessa campanha em uma situação muito delicada e muito difícil. A reforma trabalhista nos impôs uma realidade perversa, porque atinge 43 cláusulas da nossa Convenção Coletiva de Trabalho (CCT), o que corresponde a 61%. O veto a ultratividade coloca uma situação para a gente em que, a partir do dia 1º de setembro, não existe mais a CCT dos trabalhadores bancários. De forma que será um desafio muito grande discutir ponto a ponto com os banqueiros – patrocinadores da reforma trabalhista. É necessário que a categoria – que, de certa forma, transferiu a responsabilidade para os sindicatos, no sentido da realização dos encontros, conferências, organização de assembleias e greves – esteja presente e junto a sua entidade para alterar a correlação de forças. Só com a participação efetiva da categoria é que poderemos alterar essa situação. Outro aspecto é a participação dos bancários no processo político do país. Se ausentar deste momento será um erro gravíssimo, colocando em risco o futuro de gerações. Temos que eleger candidatos comprometidos com os trabalhadores e seus interesses. Isso tem uma relação direta conosco, pois se nós vencermos as eleições, poderemos revogar todas essas medidas. A responsabilidade desse processo da campanha salarial e das eleições passa pela consciência dos trabalhadores e bancários.

 

De que forma a categoria conseguirá resistir na defesa das pautas com as dificuldades de negociação?

Resistir na defesa das pautas. A nossa CCT completou 25 anos. Em todo esse tempo a gente tem ampliado as nossas conquistas, e conseguimos ticket alimentação, ticket refeição, PLR, abono assiduidade, questões referentes à saúde, às oportunidades, gênero, abono de férias. Nós avançamos muito nesse processo, então é necessário que a categoria tenha consciência de que tudo isso foi fruto de lutas, até atingirmos o patamar de ser a convenção coletiva mais importante do Brasil. Ela é uma referência para outros países e vai ser um desafio muito grande manter isso. É preciso ter consciência que, para manter essa CCT, vai ser necessário muito esforço, muita garra e muita luta.

 

Só no primeiro trimestre deste ano já foram fechados 2.226 postos de trabalho bancário. Qual a perspectiva da categoria em relação ao avanço da pauta relacionada à mais contratações nas negociações específicas enquanto os bancos avançam com contratações de funcionários temporários?

Os fechamentos de agências têm uma relação direta com esse governo golpista que tomou de assalto o Palácio do Planalto. A partir do momento do desmonte do Estado, do enfraquecimento das estatais e da não priorização dos bancos públicos como agentes de desenvolvimento do país, a situação começou a nos preocupar. Quando Lula assumiu a presidência com uma crise violenta e desemprego na categoria bancária, o governo pegou essas estatais como o Banco do Brasil, a Caixa Econômica, o Banco do Nordeste, o Banco da Amazônia e outros bancos estaduais e criou políticas públicas para serem geridas por estas instituições. E isso fez com que a economia crescesse, criando a oportunidade de novas agências e de emprego. Então nós saímos de um patamar de 300.000 bancários, a partir de 2003, e atingimos, em 2015, mais de 500.000 bancários. Isso foi fruto do trabalho de um governo sério e comprometido com o desenvolvimento do país. Nós não estamos vendo isso agora. Estamos vendo um governo que anuncia o fechamento de agências, precariza o atendimento – inclusive para jogar a população contra os bancários. E, nos bancos privados, segue a lógica do lucro pelo lucro, então os trabalhadores são explorados, aumentam os problemas de saúde. Então estes são temas que serão debatidos na campanha salarial.

 

Temos presenciado uma intensa movimentação, principalmente dos bancos privados, de colocar em prática o atendimento cada vez mais digitalizado para os clientes. De que forma será pautada o debate de tecnologia e precarização do trabalho?

Nós não somos contra o desenvolvimento da questão das novas tecnologias. Os trabalhadores vão ter que se apropriar de todas as informações para dar resposta a essa questão. Hoje vários atendimentos já são realizados nas agências digitais. Os trabalhadores criam carteiras que estão dando certo e os bancos transferem essas contas para uma agência digital, fazendo com que o bancário retorne para construir uma nova carteira. Essa é uma lógica que vai acontecer: as operações sendo feitas através dos meios eletrônicos. É algo que nós não podemos fugir. Temos que enfrentar, entender e nos apropriar de todas as informações. A tecnologia interessa também ao país e aos trabalhadores, o que não pode é que ela gere demissões. Nós entendemos que o sistema financeiro necessita de trabalhadores. Basta entrar em uma agência que nós vamos ver a falta de funcionários e acúmulo de trabalho, o que tem gerado adoecimento na categoria. Este debate já está sendo levantado e vamos aprofundar também essa discussão.

 

O governo Temer tem acelerado ainda mais o processo de sucateamento das empresas públicas para o serem entregues ao setor privado. Como será pautada a defesa das empresas públicas este ano?

Este governo golpista só tem compromisso com o capital financeiro e com os entreguistas. Não tem nenhum comprometimento com os trabalhadores ou com o país. É um governo “lesa-pátria”. A proposta do governo é esvaziar o banco e entregar ao setor privado. Se hoje é concentração de renda já é violenta e torna os bancos privados gigantes, a ideia do governo é entregar a Caixa Econômica e o Banco do Brasil. Quem perde com isso é a população, pois cada vez mais é dificultado o acesso à renda. Nós presenciamos no governo Dilma que, quando era necessário fazer algumas mudanças em relação às taxas de juros, ela utilizava os bancos públicos para abaixar as taxas, causando, assim, um enfrentamento muito grande, pois os bancos privados foram obrigados a abaixar os juros. Por tanto, os bancos públicos têm um papel fundamental para o desenvolvimento do país, porque sem eles não conseguiremos fazer políticas públicas e crescer, já que aos bancos privados só interessa o lucro.

 

Recentemente o Imposto Sindical foi extinto devido à reforma trabalhista. Antes disso, já não havia consenso entre as centrais sindicais sobre a cobrança do imposto. O que se pretende com a regulamentação e quem defende?

Neste debate, nós da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), sempre defendemos o imposto sindical. Porque é com este recurso que nós fazemos a luta. Era com ele que nós tínhamos condições de enfrentar os patrões, fazer com que os sindicatos se organizassem melhor, promovessem a formação de sua diretoria e dos trabalhadores, criassem estruturas para dialogar com a sociedade – como a imprensa –, participassem de todos os eventos e também, no período de greve tinha recursos para fazer a luta. Por isso que nós entendíamos que o imposto sindical era fundamental. E olha que os sindicatos não ficavam com tanto, apenas com 60% do valor. Outras centrais discordavam disso e hoje estão sentindo que com o fim do imposto elas também foram prejudicadas e estão em situação complicada. O fim do imposto sindical vem com outra questão: o ataque aos sindicatos. É para dificultar a sobrevivência dos sindicatos e centrais, para fazer com que esses não sejam mais entidades fortes e que consigam mobilizar as massas, fazendo a luta por salário, por emprego, e também por transformação social. Financeiramente, a gente sabe que enfraqueceu e sabemos que teremos que repensar. Conseguimos, através da Federação dos Bancários da Bahia e Sergipe fazer um evento em um hotel, mas o que nos espera são as dificuldades. Estamos pensando inclusive em aprovar uma contribuição negocial nas nossas assembleias, mas existe outro aspecto: a Justiça está jogando contra os trabalhadores. Então nós não sabemos ainda se aprovando em assembleia, que é legítima dos trabalhadores, se este desconto será concretizado. Era dessa forma que fazíamos no passado. Apesar do imposto sindical, nós tínhamos despesas nas greves e era aprovado um desconto assistencial para cobri-las. Mas até nisso as maldades da reforma trabalhista tentam dificultar a sobrevivência dos sindicatos e impedir que de forma legítima os trabalhadores autorizem descontos para a manutenção da entidade.

 

Este é um ano de eleição, de que forma a categoria conseguirá utilizar esse momento para fortalecer a luta?

Este é um ano extremamente importante. É o momento em que a classe trabalhadora vai defender o seu projeto ou vai se tornar escrava do capital. Porque a reforma trabalhista passa realmente por rebaixar os salários e condições, trazendo para categorias que tiveram acúmulos e conquistas, perspectivas muito ruins. O desafio da população é fazer a luta econômica, mas também fazer principalmente a luta política. Nós podemos até sair vitoriosos nessa Campanha Nacional, fechando um acordo que mantém as nossas conquistas e direitos. Mas se nós perdermos as eleições, não conseguindo eleger um candidato comprometido com os trabalhadores, certamente no ano que vem eles irão implementar a reforma previdenciária e outras medidas. Então é necessário que se discuta com a categoria: ao não participar da campanha e se ausentar das eleições gerais, certamente a nossa situação ficará muito pior do que está hoje.

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