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“O atual período parece com àquele vivido à época do Golpe Militar de 1964”. Confira a entrevista com Ruy Medeiros.

Convidamos o professor, advogado e historiador, Ruy Medeiros, para falar sobre a atual conjuntura e o avanço da extrema-direita. Confira:

Em relação às Eleições 2018, o que o Sr. acha que contribuiu para o avanço dos votos em candidatos de extrema-direita?

Pode-se perceber que a onda conservadora, e em alguns casos fascistas, desenvolve-se no contexto da crise econômica mundial. Trata-se de crise que mantém diferença de outras por apresentar ciclos curtos de crescimento seguido por ciclos curtos de recessão. O caráter mundial da crise não implica que, ao mesmo tempo, como em 1929 “todos” os países estejam em recessão. Essa crise traz dentre outros efeitos, a insegurança atual e em relação ao futuro, migrações descontroladas, aprofundamento do vínculo fundamentalista da politica com a religião e mal estar quanto ao desfazimento de supostos valores tradicionais e preconceitos antes arraigados. As referências são desfeitas e a sensação de insegurança aprofunda-se. Aqueles que não se detêm na análise resolvem trocar o medo contra todos para se submeterem ao medo do Estado. No caso, mesmo que esse Estado seja fascista. Os representantes da extrema direita representam essa troca do medo, esse desconforto com a dissipação de velhos preconceitos em que se ancoravam. Qualquer demagogo capta essa disposição e é capaz de fazer uma leitura politica a partir da nossa ordem, não desvelamento de certas questões como gênero, e da execução de pessoas envolvidas com o crime.

 

O Sr. concorda que algumas ideias propagadas por essa extrema-direita se assemelham aos ideais do fascismo?

Primo Levi, consagrado escritor, ele próprio vitima dos nazistas, pois esteve em campo de concentração preso, disse que “cada época tem seu fascismo”. E assim é. Observe a exploração da idéia nacional tão cara as nazifascistas, a falsa defesa da família e a demagógica fusão da religião com a politica. Compare o culto à personalidade de Hitler, Mussolini, Franco, com o endeusamento dos lideres de extrema-direita, o apelo ao medo, as intimidações praticadas, a disseminação do comportamento de adesão fanática a um suposto restaurador da moral etc, que compõem o repertório de práticas nazistas.

 

Quais os riscos deste tipo de ideologia para a classe trabalhadora e para as minorias, a exemplo da comunidade LGBTI, negra e para as mulheres?

Concretamente, numa situação de descenso das lutas reivindicatórias e de desorganização politica de setores populares, o fascismo penetra demagogicamente, cria inimigos, propõe retomada do crescimento, restauração de valores etc, e isso divide profundamente os pobres e lança para a direita a classe média. O fascismo aprofunda a discriminação de comunicadores, de grupos de orientação sexual fora do padrão macho-fêmea, dos negros, feministas, etc. Todos esses, no limite, passam à situação de bodes expiatórios de todos os males, pecadores contra os quais políticos inescrupulosos sob vestes religiosas, muitas vezes, lançam ás suas feras fanatizadas.

 

A propagação de notícias falsas, com forte apelo moral, sempre foi uma estratégia empregada pelo setor conservador. Como o Sr. avalia a utilização das Fake News nessas eleições?

As notícias falsas, com forte apelo moral, são contraditórias porque a mentira não é ética. Então, a noticia falsa nunca pode servir à moral, mesmo à moral conservadora. Mas, uma vez divulgada, propagada amplamente, no campo fértil dos inseguros ou dos analfabetos políticos ela tem efeito devastador. Para muitos já é verdade, como ocorreu com a noticia do Kit Gay que povoou o vazio de certos cérebros.

 

Partindo do contexto histórico brasileiro, a atual conjuntura possui semelhanças com momentos onde a democracia esteve em risco no passado?

Toda crise se parece, inclusive quanto às propostas alternativas no âmbito da economia (politica econômica), soluções de força na politica, pantominas de partidários de candidato a ditador etc. O apelo atual a um tipo de Deus, à moral difusa (não se trata exatamente de ética), à nacionalidade, ao medo de adversários transformados em inimigos, a intimidação contra esses etc, tudo isso faz, apenas na forma, o atual período parece com àquele vivido à época do Golpe Militar de 1964.

 

Durante a primeira década dos anos 2000 muitos países da América Latina elegeram presidentes com discursos alinhados mais à esquerda. Tomando o Brasil como exemplo, o Sr. considera que faltou coragem para realizar as reformas que realmente interessavam aos trabalhadores?

Sim. A sociedade não politizada. Movimentos sociais perderam autonomia, a redução de sonhos ao consumo, etc. Podem ser creditados ao sistema capitalista, mas o governo o representou eficazmente.

 

Em sua opinião, qual o caminho que a classe trabalhadora deve seguir para a construção de uma sociedade mais igualitária e com justiça social?

Organização. Autonomia. Adoção de ideologia libertária. Educação política. Profunda interlocução entre grupos de esquerda, democráticos.

 

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