Nesta edição, entrevistamos a delegada da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM) em Conquista, Iara Gardênia, sobre a violência de gênero.
A violência contra a mulher ainda é um problema de grandes proporções no Brasil. Como ela pode ser combatida? O primeiro passo para combater a violência doméstica é quebrar o ciclo. Para isso, a vítima precisa denunciar. Muitas vezes, a vítima sofre violência física, psíquica, moral, sexual, matrimonial, e fica em casa porque ela é dependente mentalmente e financeiramente do seu companheiro. Esse é um problema muito ruim, porque notamos o quão dependente é a vítima. Por isso, nós precisamos orientar, e para isso, temos procedimentos nos quais elas passam por psicólogos para mostrar que elas têm valor, que elas podem trabalhar, que elas podem criar os filhos, que eles também podem ir para creche enquanto trabalham para prover a casa.
Dados do FBSP apontam ainda que cerca de 52% das mulheres que sofreram agressão em 2018 permaneceram caladas. Quais são os motivos mais comuns ligados a ausência de denúncia? A dependência é um dos motivos mais comuns para a não realização das denúncias. Muitas vezes elas têm seis, oito filhos e precisam garantir a presença do mantedor do lar. Certa vez, um agressor foi preso, mas foi a vítima quem pediu para que o valor da fiança fosse mais baixo porque ela precisaria pedir aquele dinheiro emprestado para ele sair. Quando questionada sobre essa contradição, ela colocou que apesar de tudo, ele nunca havia deixado faltar o pão na mesa. Eu imagino que o que está colocado para ela é pensar que é incapaz de prover o próprio lar. São vários fatores e arestas que impedem as mulheres de seguir sua vida feliz e plena.
Essa violência é registrada em todas as classes sociais? É importante colocar que essa violência atinge todas as classes sociais. Nas classes altas a gente tem o exemplo do quanto familiares, que buscam manter o modelo do relacionamento de fachada, impedem essa denúncia, desestimulando essas mulheres.
O Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) divulgou que seis em cada dez brasileiros presenciaram alguma cena de violência contra a mulher em 2018, incluindo cantadas e abordagens desrespeitosas, como assédio moral e sexual. Existem leis que coíbem essa prática? Existem, sim, leis de proteção. Agora no Carnaval as mulheres saíram com o adesivo “não é não!”, e os homens já conhecem e sabem que a importunação ofensiva é crime e dá cadeia. Isso é notório, com os meios de comunicação bastante ágeis com a viralização de mensagens. Em Vitória da Conquista foram muitos homens com camisas com paródias que davam a entender que estavam no desejo da paquera, mas, estavam com medo. A lei pegou e todos já estão sabendo. Eles sabem quais são suas obrigações e sabem que não podem abordar a mulher.
Tem ocorrido muitas denúncias de assédio em Conquista? Recebemos muitas denúncias quanto a importunação no transporte coletivo, e inclusive tivemos algumas prisões efetuadas. São casos de estupro mesmo, e em um caso o homem ejaculou na calça da mulher. Em algumas ocorrências, a falta de câmeras funcionando dificulta a identificação do agressor. Diante disso, encaminhamos um ofício solicitando que a empresa de ônibus ativasse todas as câmeras nos ônibus para que possam auxiliar nosso trabalho.
As políticas públicas existentes têm demonstrado efetividade no combate à violência contra a mulher, sobretudo em Vitória da Conquista e na Bahia? Nós temos uma rede multidisciplinar que atende a mulher em situação de violência e seus dependentes. Quando uma mulher sofre violência, a família toda sofre, então nós temos que trabalhar não só punindo o agressor, mas, também tentando resgatá-lo para que talvez ele possa ser inserido, depois do processo, na célula familiar. Hoje a política social é ampla e eficaz. No entanto, é também uma política lenta, porque o tratamento não é assim rápido. A mulher que entra em tratamento com psicólogo pode levar até 3 anos para ter alta e por ser algo a longo prazo, muitas vezes essas mulheres não voltam e não seguem com o trabalho. Um dos avanços observados é que antes, a medida protetiva demorava muito tempo e hoje a mulher chega na delegacia e já é sugerida a ela a medida protetiva de urgência para afastar o agressor do lar e familiares, e também qualquer tipo de contato mesmo que por meios de comunicação. E o descumprimento dessa medida leva à cadeia.
As opiniões expressas não refletem, necessariamente, o posicionamento da diretoria do SEEB/VCR. Confira a entrevista completa no site.