Artigo de Daniela Costa Gerelli.
No dia 28 de agosto, comemoramos o Dia do Bancário e da Bancária, data marcada pela assembleia de 1951 que decidiu a paralisação da categoria em luta por um reajuste salarial, com duração de 69 dias. A categoria teve um percurso com grandes mobilizações, como a que ocorreu em 1983, junto a muitas outras categorias, com Greve Geral em todo país e a greve de 1985¹, que foi a primeira paralisação nacional dos bancários desde a década de 1960 e obteve grande visibilidade pública.
É também categoria marcada por negociação coletiva unificada nacionalmente na década de 90 e com significativo salto de cláusulas em suas convenções coletivas²:
Dentre essas cláusulas, constam acréscimo e manutenção de cláusulas relevantes, como folga assiduidade; ampliação da licença-paternidade; previsão específica para a realização de transporte de numerário; programa de retorno ao trabalho; conteúdo para os afastamentos por doença superiores a 15 dias; determinação para a declaração do último dia trabalhado; previsão de Programa de Desenvolvimento Organizacional para a Melhoria Contínua das Relações de Trabalho; abono único; previsão para a qualificação profissional/certificação aos empregados ativos e o adiantamento emergencial de salário nos períodos transitórios especiais de afastamento por doença.
Nos últimos anos, não apenas os bancários, mas toda a classe trabalhadora vem sendo alvo de mudanças legislativas sob o argumento da retomada econômica e promoção de trabalho, quando, na verdade, as alterações visam flexibilizar as relações de trabalho com propósito de reduzir direitos trabalhistas. Dentre elas, citamos a “Reforma Trabalhista” aprovada em 2017, as propostas de Reforma da Previdência e a recente MP nº 881, nomeada pelo próprio governo de “MP da Liberdade Econômica”, que traz em seu conteúdo previsões que flexibilizam a jornada de trabalho.
Além destas medidas que relativizam as relações e impactam os direitos trabalhistas, o mundo do trabalho passa por transformações decorrentes de um processo de financeirização e da automação das atividades. O primeiro conceito, partimos dos ensinamentos de Braga³ (1997) no contexto de um novo processo de acumulação de riquezas, vinculado aos ativos financeiros, no qual a figura do trabalhador torna-se dispensável para a o ganho de lucratividade. A automação das atividades em si é ensinada por Holzmann (2011, p.56):
A categoria bancária é uma das mais atingidas por esse processo que visa exclusivamente o aumento do lucro. Os primeiros sinais se deram pelo uso do autoatendimento, caixas eletrônicos, bancos virtuais, aplicativos, entre outros. O uso desses meios tecnológicos, bem como da descentralização da atividade pela terceirização das atividades, estão cada vez mais frequentes, conforme atual estudo da Febraban 4:
Conforme observamos, há considerável ampliação do uso de tecnologias, como os aplicativos de celular e a internet banking, e, em contrapartida, a redução das agências bancárias e trabalhadores.
Dados do DIEESE em 2018 5 identificam o crescimento da lucratividade dos bancos e uma intensa redução de postos de trabalho:
Ainda nesse estudo, em análise dos maiores bancos do Brasil, o DIEESE aponta a redução dos postos de trabalho por banco, bem como o encerramento de agências:
Os impactos da ampliação da tecnologia, somada aos interesses deste capital contemporâneo de descentralização das atividades, majoração de lucros e redução de custos, certamente acarretarão o aprofundamento da redução de postos de trabalho.
É importante destacar que não tratamos a tecnologia como inimiga, muito pelo contrário, ela é muito bem-vinda para extinguir trabalhos desumanos, melhorar as condições de vida e do trabalho, promover tempo de descanso e lazer aos trabalhadores! O questionamento parte do contexto em que ela tem sido utilizada de forma desmedida, com propósito de reduzir custos da empresa e ampliar a lucratividade.
Para os bancários e as bancárias, o cenário de um futuro não tão distante é justamente a expansão da substituição dos funcionários pelos “robôs”. Nesse dia emblemático, é necessário mais que confraternizar, cabe-nos refletir sobre essa movimentação e fazer questionamentos necessários: está correta a substituição avassaladora da mão de obra bancária pelas tecnologias? Não deveríamos ter uma regulação sobre a utilização dos meios tecnológicos? O uso da tecnologia não deve ser taxado de alguma forma pelo Estado?
Fonte: LBS.adv.br
¹ A greve foi aprovada em um Encontro Nacional dos Bancários, realizado em Campinas em 31 de agosto de 1985, reunindo 10 mil bancários na cidade e aproximadamente 30 mil na cidade de São Paulo (http://www.bancariosdepiracicaba.com.br/data+base+da+categoria+bancaria+e+simbolo+de+lutas+e+conquistas.aspx e https://spbancarios.com.br/historia) e, além de trazer ganhos aos trabalhadores, iniciou um padrão tático de ação sindical baseado em campanha com posterior negociação, seguida ou acompanhada de greve; dinâmica que passou a influenciar outras categorias (COLOMBI, Ana Paula Fregnani. Entre a fragmentação e a ação unificada: uma Análise da atuação do Sindicato dos Bancários e Financiários de São Paulo, Osasco e Região durante os anos 2000. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Economia. Orientador: José Dari Krein. Campinas, SP: (s.n.), 2014.)
² Este artigo tem por apoio o Trabalho de Conclusão do Curso apresentado à Pós Graduação Lato Senso do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Especialista em Economia do Trabalho e Sindicalismo, sob orientação do Prof. Dr. Jose Dari Krein e coorientação de José Eymard José Loguercio em 2017 com o Tema: “As tendências das negociações coletivas dos bancários após estruturação do sindicalismo CUT”. Neste estudo foram analisadas as convenções de 1978/1979, 1991/1992, 2001/2002, 2004/2005, 2010/2011 e 2016/2018.
³ BRAGA, José Carlos de Souza. Financeirização global. O padrão sistêmico de riqueza do capitalismo contemporâneo. In: Poder e dinheiro – Uma economia política da globalização. Maria da Conceição Tavares e Jose Luís Fiori (Organizadores). Petrópolis, RJ: Vozes, 1997. O termo automação é empregado, atualmente, para definir o processo de inovação tecnológica de base microeletrônica na produção de bens e serviços. É com estes significados que se nomeiam, por exemplos processos de automação bancária ou automação industrial, traduzindo a utilização da informática nestes setores de atividade. O significado do termo é, no entanto, bem mais amplo. Ele diz respeito a todo instrumento ou objeto que funcione sem a intervenção humana direta, podendo ser aplicado a qualquer tipo de máquina ou artefato que opere deste modo. (2011, p. 56)
4 Disponível em: <https://ciab.com.br/assets/download/researches/research-2019_pt.pdf>. Acesso em 27/08/2019. A Pesquisa FEBRABAN de Tecnologia Bancária, realizada pela Federação Brasileira de Bancos em parceria com a Deloitte de 2019.
5 Disponível em: <www.dieese.org.br/desempenhodosbancos/2018/desempenhoDosBancos1semestre2018.html>. Acesso em 27/08/2019.