Paulo de Tarso Magalhães David
“O mundo é um lugar perigoso de se viver, não por causa daqueles que fazem o mal,
mas sim por causa daqueles que observam e deixam o mal acontecer.”
Albert Einstein
Sempre que emito uma opinião, geralmente crítica, a gestão do Governo Federal, alguns bolsonaristas, assumidos ou envergonhados, afirmam que estou “torcendo contra o governo”. Eles alegam que essa atitude significaria “torcer contra o Brasil”, ou ainda “torcer para que o país não dê certo” e que isso “não é seria uma atitude digna de um democrata”. Mais uma vez, venho a público discordar de todos estes argumentos. Como sugere o título, neste artigo explicarei porque não posso (nem devo) torcer para esse Governo dar certo. Leia a íntegra a opinião do doutor Paulo de Tarso.
Torcer a favor do governo Bolsonaro significaria ser cúmplice do genocídio indígena e quilombola. O extermínio dos povos originários é uma política explícita deste Governo que odeia minorias. A solução final para a questão, é o que pode acontecer se ele der certo.
Torcendo pelo sucesso do governo, eu também seria cúmplice da devastação do meio ambiente, da entrega da Floresta Amazônica para gangues de madeireiros, mineradores e para o garimpo predatório e irresponsável. Seria conivente com o esgotamento de nossas riquezas naturais e, posteriormente, da desertificação da Amazônia legal, em consequência da sua transformação em pasto. Seria um comparsa dos que querem acabar com o que resta da Mata Atlântica, com o consequente fim dos nossos mananciais, criando uma crise sem precedentes de falta d’água e caos climático.
Se esse Governo der certo, voltaremos cem anos no tempo no que diz respeito aos direitos humanos e perseguição às minorias como negros e LGBTQ+, além da volta do código civil de 1916, no que diz respeito aos direitos das mulheres, a família e a propriedade.
Torcer para esse governo é ser sócio de uma agenda autoritária, com apoio aberto a volta da tortura institucionalizada, da censura, do ataque e perseguição aos jornalistas e a imprensa livre, do consenso forçado, da perseguição política, da imposição do pensamento único e da cultura da morte.
Na agenda econômica, mesmo com resistência o Governo avança em seu projeto liberalizante, que tem como consequência final a extinção dos direitos trabalhistas. Apoiar esse plano significaria ser a favor de, no ponto de vista trabalhista, voltarmos aos primórdios da revolução industrial, do capitalismo sem freios, da informalidade no trabalho e do coronelismo no campo.
Torcer para o sucesso de Bolsonaro é se associar a ideia de um Brasil fechado para o resto do mundo, o que me faria um correligionário do retorno a posição de país semi-colonial e subalterno aos interesses norte-americanos, onde se comemoraria não a independência do Brasil, mas o 04 de julho. Pois o caminho traçado por esse governo tem transformado o Brasil num pária político e ambiental, para todo o mundo.
Por fim, se esse governo der certo e colocar em prática todo o seu plano, teremos o fim da educação universal, da liberdade de cátedra, da escola pública, da educação crítica e transformadora de Paulo Freire. Assim, deixariamos de formar cidadãos pensantes, para institucionalizar a perseguição de professores e da liberdade de expressão.
Não se pode culpar pessoas por resultados de eleições. Mas a reflexão deve ser feita. Quem não poderia prever o desastre dessa escolha democrática? O histórico de trabalho pífio e posturas beligerantes do deputado Bolsonaro apontavam sempre o desequilíbrio emocional e a incapacidade de agir sob qualquer pressão e agora diante de uma crise, política e sanitária e econômica, como nunca vimos vai de repente desenvolver habilidades que nunca teve na vida? Seu entorno próximo sempre foi de indivíduos perigosos. Tornou-se a opção entre candidatos saídos do rescaldo da lama da corrupção. Como posso torcer para isso dar certo?
Às vezes, a democracia dói. Mas é preciso defendê-la mesmo na dor.
Por tudo isso minha única opção é torcer contra esse Governo. Porque o êxito de Bolsonaro representa a destruição do país pelo qual luto e sempre lutarei. Porque o seu sucesso representa um risco aos valores democráticos, ao meio ambiente e a própria vida dos brasileiros.
Continuarei torcendo contra, se necessário, pelos próximos dois anos. Mas, se Deus for brasileiro e tiver piedade de nós, esse governo cairá antes, com um bem-vindo impeachment. Vamos fazer o que recomenda Confúcio: Até que o sol não brilhe, acendamos uma vela na escuridão.
Paulo de Tarso Magalhães David é advogado e professor universitário
Fonte: Blog do Anderson
As opiniões expressas não refletem, necessariamente, o posicionamento da diretoria do SEEB/VCR.