O Brasil tem vivido um momento de intensas mobilizações políticas e conflitos ideológicos. Diante deste contexto, convidamos o professor , advogado, e historiador Ruy Medeiros, para falar sobre as manifestações e de que forma a classe trabalhadora está sendo afetada pela crise.
Quais as diferenças entre as manifestações de julho de 2013 e as atuais? Não alimento a ilusão de que o movimento de julho de 2013 tenha sido de anjos. Foi um movimento complexo que abrigou aqueles que desqualificavam a atividade partidária, a direita e pessoas à esquerda (e nessa, pessoas dotadas de nível de radicalidade contra símbolos do poder). Alguns desses foram processados penalmente. Hoje, há de comum a desqualificação da atividade partidária (são escorraçados políticos de diversas matrizes), porém, diferentemente de 2013, polarização aguçada, predomínio do discurso de direita nas manifestações maiores, judicialização generalizada e espetacularizada.
As denúncias relacionadas ao Partido dos Trabalhadores trazem também prejuízos para as organizações de esquerda e suas lutas? Sim. Embora não se trate de partido de esquerda, o PT abriga muitos militantes de tendências de esquerda que não souberam se posicionar desde o mensalão, facilitando a opinião que é o partido (e não uma fração) que está envolvido nos diversos atos ilícitos cujas notícias alimentam os meios de comunicação exaustivamente. Como o PT se atribuía e se reivindicava da esquerda, e como se vive em momento de crescimento da direita, a própria esquerda sofre desqualificação desonesta. Há uma esquerda séria que luta na contracorrente e hoje tem como uma de suas tarefas a difícil missão do esclarecimento em que se pretende confundir opinião pública com opinião publicada, experiências político-partidárias e mesmo histórias indefensáveis como do espírito e da identificação da esquerda. Não se pode evitar a desonestidade no particular, mas pode-se combatê-la em defesa do programa maior de criação de uma sociedade de iguais.
Podemos dizer que algumas entidades têm se preocupado mais com a defesa do governo do que com a defesa dos trabalhadores? Um desserviço político à causa dos trabalhadores foi realizado por muitos sindicatos e entidades que não lutaram contra sua própria natureza, isto é, para deixarem de ser sindicatos e entidades, e se deixaram amarrar numa cooptação que sinaliza todo o abandono do caminho da autonomia.
Qual o caminho que os trabalhadores devem seguir em meio ao embate dos que defendem o cegamente o impeachment ou o governo? Há tarefas de inteligência: formular análises do atual estágio do capitalismo, elaborar e discutir amplamente em programa operário nas condições atuais do mundo, demarcar campo com experiências atuais e anteriores da atuação partidária. Isto envolve questões práticas de organização, educação e propaganda. Em rigor, não se trata de alinhar-se ou não em impedimento da presidente Dilma. A questão vai além disso. A questão do impedimento abre espaço para a discussão dos limites da institucionalidade e quanto à autonomia do movimento. Mas é evidente, como indicam os fundadores, que a democracia nos interessa para que lutemos pela real democracia, não à opressão de milhões pelos poucos detentores do capital.
As opiniões expressas na entrevista não refletem, necessariamente, o posicionamento da diretoria do SEEB/VCR.