O ministro do Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki, determinou o afastamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, de seu mandato de deputado. Com a decisão em caráter liminar (temporária), anunciada na manhã desta quinta-feira, o peemedebista também é afastado do cargo de presidente da Câmara dos Deputados. Com o afastamento, quem assume interinamente a presidência da Casa é o primeiro-vice, o deputado Waldir Maranhão (PP-MA), aliado de Eduardo Cunha.
Teori Zavascki acatou o pedido da Procuradoria-Geral da República, feito em dezembro do ano passado, no qual o procurador Rodrigo Janot alegava que o parlamentar não podia exercer o cargo porque usava de sua função para se defender do processo de cassação de seu mandato no Conselho de Ética. Cunha é réu na Operação Lava Jato, que apura desvios de recursos na Petrobras.
O deputado já foi notificado da decisão e pode recorrer dela. Oficiais de Justiça foram à residência oficial do presidente da Câmara, em Brasília, e tiveram de insistir para que ele recebesse a notificação. Os advogados do peemedebista não se manifestaram até o momento.
Na tarde desta quinta-feira, o plenário do Supremo, formado por 11 ministros, deve analisar um outro pedido de afastamento de Cunha, feito pelo partido Rede Sustentabilidade. A decisão de Zavascki, de 73 páginas, é uma liminar. O mérito dela ainda deverá ser analisado pelo plenário do STF. Como só foi afastado dos cargos, e não cassado, Cunha não perde o foro privilegiado. Por enquanto só pode ser investigado pela Procuradoria-Geral da República com a autorização da suprema corte. Desde o início da Lava Jato, Cunha se tornou alvo de cinco inquéritos e é réu em uma outra ação. Ele é suspeito de crimes como corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Na sua decisão, o magistrado justificou que qualquer agente político pode ser afastado de suas funções, inclusive juízes e deputados. “Os demais agentes políticos, não investidos de mandato eletivo, poderão ser judicialmente afastados da função até mesmo fora do âmbito do processo criminal, como ocorre em ações civis de improbidade administrativa (…) Nessa perspectiva, não há razão para conferir tratamento diferenciado aos parlamentares, imantando-os contra qualquer intervenção preventiva no exercício do mandato por ordem judicial", ressaltou. "Assim, é inteiramente cabível, por certo que em circunstâncias excepcionais devidamente justificáveis e justificadas, o pedido de afastamento temporário do exercício do mandato parlamentar.”
Quando analisou o afastamento da presidência da Câmara, o ministro entendeu que Cunha estava com poderes muito amplos, que “interferem sensivelmente na gestão dos diversos serviços daquela Casa Legislativa”. Zavascki ressaltou ainda que para dirigir uma das casas do Congresso Nacional é necessário ter “escrúpulos” compatíveis com a honorabilidade da instituição. “A ascensão política do investigado à posição de Presidente da Câmara, além de não imunizá-lo de eventuais medidas penais de caráter cautelar, concorre, na verdade, para que o escrutínio a respeito do cabimento dessas medidas seja ainda mais aprofundado”.
Na decisão, o ministro citou que as trocas de mensagens entre Cunha e os empreiteiros José Aldemário Pinheiro Filho, conhecido como Léo Pinheiro, e Otavio Marques de Azevedo, da Andrade Gutierrez, em que ressaltam a existência de pagamentos ilícitos feitos ao deputado. Os dois executivos foram presos na operação Lava Jato. No documento foram destacados também o envolvimento de Cunha com outros investigados pela Polícia Federal como os empresários Ricardo Pernambuco e Ricardo Pernambuco Júnior que admitiram terem pago propina para o deputado em contas dele no exterior.
Zavascki ressaltou que era necessário afastar Cunha da presidência porque ele poderia continuar obstruindo as investigações. “Está claro, pelos elementos trazidos, que há indícios de que o requerido, na sua condição de parlamentar e, mais ainda, de Presidente da Câmara dos Deputados, tem meios e é capaz de efetivamente obstruir a investigação, a colheita de provas, intimidar testemunhas e impedir, ainda que indiretamente, o regular trâmite da ação penal em curso no Supremo Tribunal Federal, assim como das diversas investigações existentes nos inquéritos regularmente instaurados.”
Outra razão que interferiu na decisão do ministro do STF foi a possibilidade de Cunha se tornar presidente da República, já que será o primeiro na linha sucessória, caso a presidenta Dilma Rousseff sofra impeachment nas próximas semanas. “Não há a menor dúvida de que o investigado não possui condições pessoais mínimas para exercer, neste momento, na sua plenitude, as responsabilidades do cargo de Presidente da Câmara dos Deputados, pois ele não se qualifica para o encargo de substituição da Presidência da República, já que figura na condição de réu no Inq. 3983, em curso neste Supremo Tribunal Federal”.
Zavascki ressalta ainda que o ideal era que Cunha fosse afastado por seus pares, conforme prevê o regimento da Câmara dos Deputados, porém, ele entendeu que no Legislativo o deputado estava se tornando um intocável. “Em situações de excepcionalidade, em que existam indícios concretos a demonstrar riscos de quebra da respeitabilidade das instituições, é papel do STF atuar para cessá-los, garantindo que tenhamos uma república para os comuns, e não uma comuna de intocáveis”.
Fonte: El País