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“A conjuntura atual é desafiadora”

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A economista e supervisora técnica do DIEESE na Bahia, Ana Georgina Dias, é a nossa entrevistada nesta edição. Ela falou sobre a Campanha Salarial, o atual cenário econômico, entre outros assuntos. Confira.

Qual o cenário econômico que os bancários enfrentarão no período da Campanha Salarial?

 O cenário será bastante ambíguo. Por um lado, o desempenho econômico dos bancos continua bastante positivo com sucessivos aumentos de lucratividade. Os juros altos, ao contrário do efeito para os consumidores e o setor produtivo de um modo geral, proporcionam um aumento de lucros ao setor financeiro, fazendo com que, para este setor, a crise passe bastante longe. Por outro lado, uma conjuntura política complicada acaba tendo efeitos no cenário econômico. Inflação em alta, normalmente, dificulta a conquista de ganhos reais. Para a data-base de setembro, a inflação acumulada, medida pelo INPC-IBGE, está estimada em 9,64% e a inflação estimada pelo ICV-DIEESE já alcança 10,15%. Se levássemos em consideração apenas o desempenho do setor financeiro, poderíamos esperar um cenário favorável para a campanha salarial. No entanto, não é o que temos verificado ao longo dos últimos anos, onde este desempenho se mantém bastante positivo e com uma conjuntura geral, econômica e política, menos adversa. Certamente, os trabalhadores bancários não devem enfrentar uma campanha salarial fácil. Principalmente pela incerteza em relação aos efeitos do ajuste fiscal sobre a economia. A incerteza sobre a retomada do crescimento no curto prazo ainda é grande.

Os bancos continuam atingindo um alto índice de lucratividade. A Sra. acredita que os bancários podem conseguir o almejado reajuste de 10% de aumento real, pleiteado pela Conferência Interestadual Bahia e Sergipe?

Pelo histórico de lucratividade dos bancos, que se mantém por um longo período de tempo e sempre superando os patamares de anos anteriores, não é uma tarefa fácil responder a esta pergunta. Como dito anteriormente, lucratividade alta e desempenho positivo, não têm garantido aos bancários ganhos reais muito acima da média das outras categorias pertencentes a setores com desempenho mais modesto. O excelente desempenho dos bancos não tem significado ganhos reais maiores para os bancários. Isto se explica por vários fatores. Dentre eles: a redução na força de trabalho do setor financeiro, com a grande utilização de sistemas de automação, que reduz sobremaneira o poder de mobilização da categoria e os mecanismos de pressão utilizados pelas instituições financeiras. No entanto, estas questões não devem desmobilizar ou desanimar os trabalhadores, uma vez que, no fundo, é a mobilização da categoria que é a grande definidora do resultado das negociações. Trabalhadores mobilizados, geralmente, modificam a história da negociação.

Tivemos uma aceleração da inflação, chegando ao índice mais alto desde dezembro de 2003. Existe uma perspectiva de redução da inflação ou será preciso apertar os cintos ainda mais?

Neste momento é complicado fazer qualquer prognóstico sobre o comportamento da inflação. Principalmente porque os fatores que têm contribuído fortemente para a aceleração da mesma, ainda estão em curso. Este é o caso da alta da energia, dos preços dos alimentos e até mesmo a alta do dólar. Estes fatores têm sido determinantes para a alta nos preços. A crise hídrica tem feito com que o custo de geração de energia venha aumentando bastante ao longo do ano. Isto decorre do fato de que as empresas de geração de energia precisam recorrer ao uso de terméletricas, que possuem um custo de geração mais elevado. O problema climático também acaba tendo um papel importante na alta de preço dos alimentos, bem como a alta do dólar, que também impacta sobre outros setores. Sendo assim, elevar a taxa de juros não surte o efeito esperado sobre a inflação. Portanto, apertar ainda mais os cintos pode ser inócuo para reduzir preços e ainda ter como efeito colateral uma redução ainda maior da atividade econômica.

A emenda feita na MP 672/2015 visa estender as condições de correção do salário mínimo para os aposentados. Você considera que esta é uma boa saída para resolver a defasagem do ganho real da aposentadoria?

Sem sombra de dúvida, este seria um caminho para a conquista do ganho real pelos aposentados do INSS, que ganham acima do piso previdenciário de um salário mínimo. A Política de Valorização do Salário Mínimo, tem sido uma das responsáveis pela recuperação do poder de compra dos trabalhadores nos últimos anos. Para se ter uma ideia, de abril de 2007 a janeiro de 2015, o Salário Mínimo acumula um ganho real de 34,05%. No entanto, devido ao ajuste fiscal em curso e toda discussão envolvendo a sustentabilidade da Previdência Social a longo prazo, pode ser que esta correção não aconteça.

Medidas de austeridade fiscal e redução dos direitos trabalhistas não salvaram a Grécia da crise, há algum risco do Brasil seguir o mesmo caminho a médio ou longo prazo?

A situação do Brasil é bastante diferente da situação grega. A começar pelo fato de que não estamos numa situação de dependência financeira externa como aquele país. A despeito de toda crise propalada, especialmente pela mídia, o Brasil hoje tem uma situação econômica bem mais confortável que a Grécia. Temos reservas da ordem de R$370 bilhões, uma dívida pública muito menor e sob controle, autonomia para a deliberação de política econômica, um nível de desemprego (que apesar de estar se elevando ao longo de 2015) ainda é bastante menor que na Grécia. No entanto, medidas de austeridade fiscal, inclusive com redução de direitos dos trabalhadores, são preocupantes. Principalmente porque normalmente não surtem o efeito desejado, vide a situação dos países da Zona do Euro, e ainda podem agravar mais ainda os problemas econômicos do país.

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