Cabe agora ao Senado e ao STF, como guardião da Constituição, fazer valer a voz do povo e proteger a democracia, rejeitando qualquer projeto que, sob o pretexto de perdoar manifestantes, acabe por blindar criminosos e suas atividades ilícitas
No último dia 17 de setembro, em uma votação célere na Câmara dos Deputados, foi aprovado um requerimento de urgência para o Projeto de Lei Nº 2162/2023, de autoria do deputado Crivella (Republicanos-RJ). A proposta visa conceder anistia aos envolvidos nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, tendo o requerimento sido aprovado por um placar de 311 votos favoráveis contra 163.
A tramitação acelerada do projeto ocorre em um contexto politicamente sensível, pouco após a condenação de figuras proeminentes investigadas por atentar contra o Estado Democrático de Direito, incluindo o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, sentenciado a mais de 27 anos de reclusão em regime fechado, juntamente com oficiais de alta patente das Forças Armadas.
O projeto, que busca perdoar as condutas dos participantes dos eventos que atentaram contra as instituições democráticas, pode representar um perigoso precedente. Não se trata de um mero gesto de pacificação, mas de um movimento político que arrisca neutralizar a devida responsabilização penal e, consequentemente, beneficiar estruturas criminosas.
A redação do PL propõe anistiar não apenas os participantes diretos dos atos, mas também financiadores, organizadores e provedores de apoio logístico, incluindo a anistia para crimes conexos. Essa amplitude abre uma perigosa margem interpretativa. Embora o texto exclua expressamente crimes hediondos, contra a vida e de terrorismo (nos termos da Lei nº 13.260/2016), a generalidade da proposta cria lacunas graves, especialmente no que tange a atos de vandalismo qualificado, associação criminosa (art. 288 do Código Penal) e, mais criticamente, aos crimes investigados no âmbito dos atos antidemocráticos, como a tentativa de Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L do Código Penal) e de Golpe de Estado (art. 359-M do Código Penal).
A principal problemática reside no potencial benefício a organizações criminosas. A anistia, ao estender-se de forma abrangente a “apoiadores logísticos” e “financiadores”, cria uma zona cinzenta onde redes de financiamento ilícito e estruturas do crime organizado, como as milícias, podem encontrar um escudo para suas atividades. A menção a “crimes conexos”, conforme o art. 76 do Código de Processo Penal, poderia ser utilizada para blindar delitos como lavagem de dinheiro (Lei nº 9.613/98) e organização criminosa (Lei nº 12.850/2013), desde que vinculados, ainda que indiretamente, ao contexto dos atos.
O desenho do projeto, embora possa ser defendido por seus apoiadores como um ato de pacificação, pode ser instrumentalizado por atores do crime organizado. A anistia, caso aprovada, funcionaria como um salvo-conduto, lavando a responsabilidade penal de financiadores e arquitetos dos crimes, permitindo a expansão de suas atividades ilícitas sob o pretexto de “manifestação política”.
Este precedente limitaria severamente a capacidade de investigação das autoridades, que ficariam impedidas de avançar contra as redes que sustentam tais atos. Uma vez estabelecido, criminosos poderiam agir com maior liberdade, utilizando a lei como um escudo para pressionar o parlamento e aprovar outras pautas de interesse de suas facções.
O resultado previsível é o enfraquecimento da persecução penal contra estruturas que historicamente já se beneficiam da seletividade do sistema de justiça. Tal cenário é agravado pois, nos corredores do poder, propostas como a chamada “PEC da Blindagem” e o PL da Anistia caminham juntos nas passarelas da impunidade. Agentes que, sob o manto de uma função pública, praticam atos ilícitos, poderiam ser blindados, consolidando a prática de crimes por aqueles que deveriam zelar pela ordem.
As recentes manifestações populares, ocorridas em todo o país no último dia 21 de setembro, demonstraram a clara objeção da sociedade a qualquer medida que vise anistiar tais crimes. Cabe agora ao Senado e ao Supremo Tribunal Federal, como guardião da Constituição, fazer valer a voz do povo e proteger a democracia, rejeitando qualquer projeto que, sob o pretexto de perdoar manifestantes, acabe por blindar criminosos e suas atividades ilícitas.
A sociedade brasileira permanece vigilante!!!
Fonte: Vermelho