Home / O Piquete Bancário / Artigo / Artigo: o deputado estadual Arthur do Val deve ter o mandato cassado? SIM, por Letícia Bahia e Marina Helou

Artigo: o deputado estadual Arthur do Val deve ter o mandato cassado? SIM, por Letícia Bahia e Marina Helou

Por Letícia Bahia* e Marina Helou**.

 

“São fáceis porque são pobres.” O deputado estadual Arthur Do Val (sem partido-SP) reagiu ao vazamento dos áudios que contêm este e outros absurdos como que flagrado em alguma espécie de travessura, coisa de moleque. Mas a realidade é que suas palavras traduzem com precisão a crueldade com que o mundo trata as mulheres.

Mulheres não têm poder, protagonismo, representatividade. Na guerra e fora dela, na Ucrânia e no Brasil, nas ruas e nas Casas Legislativas, mulheres toleram toques não consentidos, engolem comentários supostamente elogiosos, transam com quem não querem, são ameaçadas de estupro, fotografadas e expostas em sua intimidade. Faltou dizer que a nossa miséria depende de homens como Arthur. O estarrecedor na fala do deputado é precisamente essa revelação: trata-se de um homem cujo prazer deriva da pobreza das mulheres.

O ex-integrante do MBL (Movimento Brasil Livre) e seus defensores tentam colocar o foco do debate no caráter privado dos áudios. Renan Santos, parceiro de viagem de Arthur à Ucrânia, ousou levantar o dedo e bradar, entre chiliques e perdigotos, que vamos perder “nosso melhor deputado” por causa de meras palavras.

“Se encontro na rua, soco até ser preso”, retuitou o ator José de Abreu sobre a deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP). “Só não te estupro porque você não merece”, vociferou o hoje presidente da República à também deputada Maria do Rosário (PT-RS).

Em 2021, a ex-deputada e candidata à Vice-Presidência Manuela D’Ávila (PC do B-RS) denunciou ameaças de estupro contra sua filha de cinco anos depois que fotos da criança vazaram. No mesmo ano, o deputado estadual Fernando Cury (sem partido) foi flagrado pelas câmeras da Assembleia Legislativa de São Paulo e responde agora criminalmente por importunar sexualmente a colega Isa Penna (PC do B-SP). Até quando trataremos assim nossas representantes?

Qualquer punição que não seja a cassação vai legitimar a violência contra a mulher. O ambiente político é inóspito para nós, que ocupamos míseros 15% dos assentos no Congresso e 12% das prefeituras brasileiras. Nas executivas nacionais dos partidos, somos 21%, e a maioria deles —22 de 32 legendas— descumpriram em 2020 o mínimo de 30% do fundo eleitoral para candidaturas femininas. Sem recurso e com poucos amigos, nossas mobilizações raramente voam alto. E aqui está nosso problema: aqueles que permitiram isso até hoje são os mesmos que vão julgar Arthur.

Não surpreende que as negociações caminhem para longe da cassação. Eleito com 478.280 votos e tendo alcançado 9,8% do total quando candidato à Prefeitura de São Paulo, Arthur também conta com 2,7 milhões de seguidores no YouTube e a força nas redes do MBL. Esses ativos interessam a partidos e políticos que querem tê-lo como puxador de votos: farão de tudo por uma punição que evite o impedimento para uma candidatura em outubro. Chegam a dar enjoo as falas acaloradas, moralistas e em defesa das mulheres dos mesmos que negociam e articulam uma pena mais branda em troca de vantagens que possam tirar para si deste episódio.

A cassação é a única consequência civilizada. É a oportunidade de, finalmente, traçar o limite do aceitável. Qualquer outro desdobramento é a manutenção da violência política contra mulheres. Estaremos atentas.

 

*Letícia Bahia é diretora-executiva da Girl Up Brasil.

**Marina Helou é deputada estadual (Rede-SP) e membro do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Assembleia Legislativa de São Paulo.

Veja Mais!

Artigo: Carlos Jehovah – poesia viva!

Por Benjamin Nunes Pereira*   Carlos Jehovah de Brito Leite, um dos grandes sustentáculos, da …