Por Clemente Ganz Lúcio*
O sindicalismo volta à pauta dos debates públicos, a partir das questões que tratam da negociação coletiva, do custeio e das suas iniciativas e lutas. Também volta a ter destaque, porque governos reconhecem o papel dos sindicatos na organização das sociedades, em especial, na repartição do produto econômico do trabalho de todos entre lucros e salários e em defesa e sustentação das democracias.
Os ataques à ação sindical dos trabalhadores são persistentes, intensos e as práticas antissindicais são contínuas. Nenhuma novidade em relação aos 2 últimos séculos de enfrentamentos. Nesse ambiente repleto de adversidades, os sindicatos brasileiros não deixaram a peteca cair.
Nos últimos anos enfrentaram as agruras que agora procuram superar. Por exemplo, os sindicatos continuam celebrando anualmente mais de 40 mil acordos e convenções coletivas de trabalho, protegendo milhões de trabalhadores, sindicalizados e não sindicalizados, conquistando aumento de salário e melhoria nos benefícios — saúde, alimentação, transporte, formação profissional —, ampliando direitos e proteções à saúde e segurança, entre outros temas.
As centrais sindicais atuam na agenda macro, como na construção da política de valorização do salário mínimo, na regulação do trabalho mediado por plataformas e aplicativos, no projeto de valorização da negociação coletiva.
A complexidade desse quadro é analisada no balanço da trajetória recente do sindicalismo brasileiro e, especialmente, nos apontamentos de iniciativas que buscam enfrentar e superar os desafios decorrentes das mudanças no mundo do trabalho, reunido na publicação da FES Brasil – Friedrich Ebert Stiftung – “Panorama do sindicalismo no Brasil 2015-2021”1.
A pesquisa selecionou 27 experiências, 1 por estado e no Distrito Federal, de diferentes categorias e foi conduzida por timaço de pesquisadores do mundo do trabalho2.
O trabalho identifica o problema da fragmentação da organização de representação e apresenta a evolução da sindicalização entre os assalariados formais no período de 2001 a 2019, com inúmeros recortes como: sexo, região, setor, grupos educacionais, faixa etária, raça/cor, tamanho do estabelecimento, entre outros aspectos. Esses dados são muito interessantes para contextualizar a interpretação da pesquisa recém divulgada pelo IBGE3, que indicou queda na taxa de sindicalização no Brasil, o que será objeto de outro artigo.
O trabalho estrutura a análise das experiências sindicais destacadas a partir de 4 dimensões constitutivas das atribuições historicamente desenvolvidas nas lutas dos trabalhadores e aquelas decorrente dos processos de institucionalização dos sindicatos:
1) considerando a capacidade desse sujeito coletivo de expressar seu poder estrutural de organizar, mobilizar, elaborar pautas e conduzir lutas;
2) poder associativo de filiação;
3) poder institucional, por meio das negociações coletivas, representação e participação; e
4) pode social, ou seja, como vocaliza a questão do trabalho na sociedade.
O balanço final indica o enfraquecimento do poder estrutural em decorrência das profundas mudanças no mundo do trabalho e na organização do sistema produtivo, da flexibilização das formas de contratação e os persistentes ataques às organizações sindicais para desqualificá-la.
Cabe ressaltar os esforços e as iniciativas, diante de toda a adversidade enfrentada, para responder aos desafios e a busca por caminhos de superação. As experiências destacadas no estudo procuram superar as adversidades, nos mais variados contextos setoriais, de categorias e políticas sindicais.
Segundo os autores, “para compensar as fragilidades identificadas em seu poder estrutural, os esforços das organizações pesquisadas se voltam para investidas nos poderes associativos, social e institucional, mobilizando capacidades de intermediação, de relacionamento, de articulação e de aprendizagem”.
Outras 3 estratégias são frequentes: novas formas de comunicação e de trabalho com a base, o oferecimento de serviços como jurídico, saúde, convênios, lazer e o apoio das instituições públicas.
O estudo evidencia a necessidade de investimento coletivo e articulado das organizações sindicais, para compreender o contexto e as perspectivas das mudanças no mundo do trabalho visando conceber e criar formas de organização e de luta, atuar de maneira articulada e cooperada, para fortalecer seu poder estrutural de mobilizar e representar os interesses das trabalhadoras e dos trabalhadores.
(*) Sociólogo, coordenador do Fórum das Centrais Sindicais, membro do Cdess (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável) da Presidência da República, membro do Conselho Deliberativo da Oxfam Brasil, consultor e ex-diretor técnico do Dieese (2004-2020).
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1 Publicação disponível em https://library.fes.de/pdf-files/bueros/brasilien/19776-20221202.pdf
2 Ana Paula Fregnani Colombi, Anderson Campos, Andrea Galvão, Elaine Regina Aguiar Amorim, Flávia Ferreira Ribeiro, Hugo Miguel Oliveira Rodrigues Dias, José Dari Krein e Patrícia Vieira Trópia.
Fonte: Diap.