São 40 anos de um movimento que colaborou para o processo de abertura democrática do país e para a história das décadas subsequentes. Paralisação conquistou a data-base de 1º de setembro e serviu de embrião para a CCT da categoria bancária
O ano era 1979. Por liberdade, aumento salarial e em defesa do direito de greve, a categoria bancária protagonizou uma forte e surpreendente mobilização. Foi durante o governo do então general João Batista Figueiredo, numa época em que os trabalhadores estavam proibidos de manifestarem-se em locais públicos, devido a vigência da então Lei de Segurança Nacional (LSN). O movimento de 14 dias, deflagrado no período de 5 a 19 de setembro, começou em Porto Alegre e em cidades do interior do Rio Grande do Sul, ganhou adesão no Rio de Janeiro e em São Paulo e foi reprimido pelos militares, com a intervenção em sindicatos e a prisão de dirigentes sindicais.
Conhecida como “greve proibida”, a paralisação dos bancários em 1979 completa 40 anos e se caracteriza como os primeiros tempos da organização da categoria, influindo no processo de abertura democrática e na história das décadas subsequentes. “Essa greve foi o embrião da Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) dos trabalhadores das instituições financeiras públicas e privadas, pois foi durante o movimento que os bancários conquistaram a data-base de 1º de setembro”, recorda Tiago Vasconcellos Pedroso, diretor Financeiro do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região, a entidade que deu início a esse movimento de repercussão nacional.
Para Rachel de Araújo Weber, diretora de Juventude da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae), a greve de 1979 lembra do tempo em que os bancários aprenderam a lutar por direitos e do quanto ainda precisam continuar resistindo e lutando. Ela considera necessário reafirmar o Brasil democrático no presente, com base no legado deixado pela paralisação do passado. “Os tempos difíceis que culminaram com o movimento estão de volta. Exemplos disso são as ameaças ao Banrisul e à Caixa Econômica Federal pública e social, pois esses bancos têm sido fatiados e esvaziados, existindo até o propósito de venda de seus setores mais rentáveis para a iniciativa privada”, diz.
Lições da greve de 1979
Há sempre lições a serem tiradas de um movimento marcado pela coragem e disposição de luta de uma categoria. A greve de 1979 abriu caminhos aos trabalhadores para seguirem adiante. Caracterizou-se como um movimento contra a ditadura militar, em defesa da liberdade sindical e pela consolidação de uma organização autônoma de todos os trabalhadores do país, culminando na criação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), em 1983. Isso estava vinculado às demandas trabalhistas.
De todo modo, a greve de 1979 não foi um movimento com ganhos econômicos, como as deflagradas pelos bancários nos últimos 15 anos, que conquistaram aumentos reais nos salários e a valorização dos pisos e da Participação nos Lucros e Resultados (PLR). “Foi uma greve que contribuiu muito para a redemocratização do país”, afirma Rachel Weber.
Em São Paulo, inspirados no slogan dos metalúrgicos do ABC – “Braços cruzados, máquinas paradas”, que meses antes haviam iniciado greve na Scania, o movimento bancário utilizou o “Cruzar os braços, dentro da agência”. A ideia consistia em não trabalhar e nem aceitar provocações, num protesto pacífico. Apesar da repressão policial contra o movimento, que foi bastante dura e desembocou em muitas demissões, a paralisação da categoria em três das principais capitais foi determinante para a construção de um outro jeito de sindicalismo que mudou os rumos das relações de trabalho no país.
Na capital gaúcha, por exemplo, o Ministério do Trabalho cassou dirigentes de vários sindicatos de bancários, entre eles Olívio Dutra, líder da categoria em Porto Alegre e ex-governador do Rio Grande do Sul, que foi preso junto com outros sindicalistas. A explosão da greve de 1979 demonstrou a insatisfação generalizada com os baixos salários, com as condições inadequadas de trabalho e com a estrutura sindical oficial.
Na época, o ambiente político de mudanças no país era favorável e levou a que a greve dos bancários recebesse apoio do movimento estudantil, dos metalúrgicos do ABC, dos jornalistas, dos padeiros e da Frente Nacional dos Trabalhadores. Até o então operário e ex-presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, visitou Porto Alegre para manifestar apoio e reforçar a greve dos bancários. Era um amplo movimento contra o regime militar, onde todos colaboravam com todos.
A participação das mulheres, todas bancárias de instituições públicas e privadas, foi decisiva para o sucesso do movimento, cujo o principal legado é a consciência de que, sem mobilização, não há maiores esperanças neste país.
Fonte: Fenae