A cotação do dólar não deve retomar patamares abaixo dos R$ 6 pelo menos até o final de 2026. Isso, pelo menos, é o que estimam economistas de bancos brasileiros ouvidos semanalmente pelo Banco Central (BC) para a elaboração do Boletim Focus.
O “novo normal” do câmbio trará consequências para a economia brasileira. Setores que faturam com exportações, como o agropecuário, devem ser beneficiados pelo dólar mais alto. Por outro lado, os preços de alimentos e combustíveis tendem a subir, o que pode afetar os juros e frear o crescimento da economia.
Ganhadores
Mauricio Weiss, economista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), ressaltou que é difícil prever o nível do câmbio porque ele responde a diversos fatores internos e externos, mas acha factível a previsão dos R$ 6.
Ele também concorda que setores da economia nacional focados na exportação serão beneficiados, mas não vê só o agronegócio ganhando com o dólar alto. Para ele, indústrias brasileiras de produtos de baixa complexidade tecnológica também devem ganhar mercado, pois seus produtos poderão ser ofertados a preços mais baixos no exterior.
“O Brasil pode ganhar mercados especialmente de setores industriais menos intensivos em tecnologia, que são mais sensíveis a preços”, disse Weiss, citando o exemplo da indústria alimentícia, que está historicamente vinculada ao agro.
Weslley Cantelmo, economista e presidente do Instituto Economias e Planejamento, incluiu as mineradoras e petroleiras na lista de beneficiados com o novo câmbio, já que elas vendem minério e petróleo cotados na moeda dos EUA.
Perdedores
Cantelmo disse que a indústria de produtos de alta tecnologia não tende a se beneficiar com o dólar alto, já que seus produtos já são mais caros. A variação do câmbio, no caso deles, pouco importa no custo de produção e no preço final.
No caso dessa indústria, aliás, o dólar alto também pode trazer malefícios, lembrou o economista. A compra de novas máquinas importadas para aumentar a produção fica mais cara com a mudança no câmbio. Fica mais difícil para o empresário realizar investimentos necessários para ganhar mercado no Brasil e fora dele.
Oreiro acrescentou que investimento demanda juros baixos. Neste caso, o câmbio tende a atrapalhar. Isso porque ele pressiona a inflação. O Banco Central (BC) combate a inflação aumentando juros. Ou seja, um empresário que estava pensando em comprar uma máquina financiada para aumentar sua produção tende a adiar esses planos.
E a população?
A população perde com o câmbio mais alto pelos dois lados.
A vantagem que o dólar alto causa para o agro e para a indústria exportadora faz com que eles mandem mais produtos para fora. Vale mais a pena exportar do que vender internamente. Com isso, a oferta de alimentos no Brasil, por exemplo, tende a ser menor. Preços podem subir.
Sobem também porque parte dos alimentos vendidos no Brasil depende de matéria-prima importada. É o caso do pão, que depende do trigo argentino.
“Alimentos sobem, tanto pelos importados quanto pelo aumento em reais das commodities que são exportadas pelo Brasil”, resumiu Weiss.
Já o malefício que o câmbio causa para quem precisa comprar uma máquina nova também é sentido pela população. Os juros dos financiamentos e empréstimos tendem a subir por conta da pressão do dólar sobre a inflação. Isso aperta as contas do cidadão.
A alta dos juros ainda desacelera a economia. O ritmo de criação de empregos, por exemplo, tende a perder força. O trabalhador perde a chance de buscar novas oportunidades e até de barganhar por salários melhores.
Weiss lembrou que o dólar alto pode até estimular a indústria nacional no longo prazo, mas esse seria um processo mais lento, que só seria sentido pela população futuramente e caso o câmbio se mantenha num patamar elevado por algum tempo.
Papel do governo
Por conta dos impactos do câmbio sobre a população, economistas defendem que o governo atue para, no mínimo, mitigar oscilações. “A oscilação de curto prazo gera choques inflacionários”, disse Weiss.
Oreiro defende que o governo, no curto prazo, deveria tomar medidas para trazer de volta ao Brasil recuperar parte dos dólares que deixaram o país recentemente para amenizar a cotação da moeda. Ele é favorável, por exemplo, à reversão total da possibilidade de exportadores brasileiros manterem os dólares recebidos por vendas ao estrangeiro fora do país, algo que foi autorizado em 2008.
Ele lembrou que a medida fazia sentido na época porque, quando foi tomada, o dólar estava baixo, prejudicando a competitividade nacional. Hoje, o cenário é o oposto.
Medidas para “compensar” a alta do dólar também foram citadas por economistas. Uma taxação extra da exportação de petróleo, por exemplo, poderia subsidiar o preço do combustível internamente em época de real desvalorizado.
Esse tipo de benefício cruzado foi apontado como uma forma do governo zelar pelo poder de compra da população, algo que é estratégico em avaliações sobre o Executivo.
Fonte: Brasil de Fato.