O Piquete Bancário traz uma entrevista com a presidente da Adusb, Márcia Lemos, sobre a situação dos professores das universidades estaduais da Bahia e como a terceirização já ameaça a categoria.
1- O governo federal vem investindo no slogan “Brasil, pátria educadora”. Hoje a situação da educação no país realmente embasa esse mote levantado pela administração do país?
Em hipótese alguma. Uma pátria educadora não cortaria 30% do orçamento destinado às universidades federais. Uma pátria educadora não permitiria que, na Bahia, somente na Uesb, fossem cortados R$ 19 milhões em suas verbas. Uma pátria educadora não deixaria de pagar os direitos dos trabalhadores da educação. Isso é o que vem acontecendo. Hoje, na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, são 333 processos de professores retidos, segundo o governo estadual e a reitoria, por falta de saldo orçamentário. Temos professores com direito à promoção na carreira, à progressão, à mudança no regime de trabalho com processos retidos desde o final de 2012. Essa é, como exemplo, a realidade das universidades estaduais da Bahia.
2- Quanto à terceirização dentro da educação, recentemente, o STF decidiu que universidades federais não precisarão mais realizar concurso público para a contratação de professores, podendo recorrer às Organizações Sociais (OSs). Esse modelo de contratação já representa uma ameaça?
Inicialmente, as contratações por OSs foram aprovadas para instituições federais, mas a gente entende que este foi o primeiro passo. Como foram aprovadas na esfera federal, provavelmente chegarão para os estados. O PREVBAHIA, que é o regime de previdência complementar que limita nosso teto de aposentadoria pelo teto do INSS, começou como um projeto federal e agora já foi estabelecido pelo governo estadual. A Uesb ainda tem concurso público, mas, se não nos mobilizarmos para fazer o enfrentamento necessário, eu não tenho a menor dúvida, não teremos mais concursos para o ingresso de professores nas universidades estaduais. Esse é o desejo do governo, e digo isso porque dois itens da nossa pauta de reivindicações, a ampliação do quadro e a realização de concurso público, não são atendidos pela administração do estado.
3- Em que implicaria a ampliação da terceirização para a educação de nível superior na Bahia?
O professor de nível superior tem que realizar ensino, pesquisa e extensão, portanto ele produz conhecimento, ele divulga conhecimento e ele tem que se qualificar por processos de mestrados, doutorados, pós-doutorados. O que permite isso é o plano de carreira, que garante remuneração durante processos de qualificações e admite concorrer a editais para financiamento de pesquisas e extensão, por exemplo. Temos profissionais com qualificação necessária para fazer as universidades públicas de qualidade, socialmente referenciadas. O professor contratado via OS ou terceirização, seja lá como eles resolvam instituir isso na Bahia, vai ser um professor que não vai construir carreira, será submetido à CLT e aos limites da terceirização na legislação, terá um salário inferior, uma carga horária maior. Obviamente, relacionando à qualidade, trará prejuízos.
4- Como os professores, aqui na região, estão se mobilizando?
Estamos com estado de greve aprovado desde o mês de março, e, no dia 07 de maio, as quatro universidades estaduais realizarão assembleias para deflagrar greve. A mobilização vem todo nesse sentido, nós compreendemos que não há outro caminho, o governo do estado não negocia orçamento, quer negociar direitos, como o reajuste linear que foi fechado na calada da noite, enviado numa sexta-feira à noite à Assembleia Legislativa. Nós, professores, estamos extremamente motivados à deflagração da greve, apesar de sabermos que isso implica em mudança de calendário, perda de férias, prejuízos financeiros, já que o governo da Bahia é o único que corta salário por não reconhecer o direito de greve. Mas já entendemos que, se não formos para o enfrentamento, direito deixará de ser direito e passará a ser concessão e privilégio.
5- No mês de maio comemora-se o Dia do Trabalhador. No cenário atual, com as perdas de direitos instituídas pelas medidas do governo federal, com retrocessos sendo discutidos e aprovados pelo Congresso Nacional, depois de repressões extremamente violentas a mobilizações no Paraná, qual a sua avaliação, como docente, da situação do trabalhador no país?
Tenho conversado com companheiros que esperavam um ano bem difícil, mas este ano tem se configurado muito mais difícil do que imaginávamos. Chegou a hora de o trabalhador perder a paciência, chega! Temos um Congresso que desencava todos os projetos de lei conservadores, que servem ao capital e que confiscam direitos trabalhistas. Olha em que ponto nós chegamos, não estamos mais lutando por instituição de novos direitos, mas por manutenção do que hoje já existe. E um exemplo foi manifestação dos professores no Paraná. Professores, professoras e demais servidores públicos sendo tratados como se a greve e a manifestação não fossem direitos do professor, sendo duramente reprimidos, como éramos no período de ditadura no Brasil. Precisamos ter muito cuidado, como classe trabalhadora, com o que está acontecendo hoje, porque o avanço da violência contra as lutas sociais é crescente. Se não formos às ruas, não mostrarmos que estamos organizados, o capital e os políticos do nosso país irão avançar sobre os nossos direitos.
*As opiniões expressas na entrevista não refletem, necessariamente, o posicionamento da diretoria do SEEB/VCR.