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“Enfraquecer as empresas públicas para depois privatizar”

Conversamos como o secretário de Finanças da Contraf e bancário da Caixa, Sérgio Hiroshi Takemoto, sobre a atual conjuntura e a perspectiva das lutas dos trabalhadores para 2019.

 

Como o Sr. avalia o início do novo governo e o que estará colocado de desafio para a classe trabalhadora?

Ainda é cedo para avaliarmos o novo governo. O que podemos avaliar são as propostas já apresentadas e aquelas que estão sendo aventadas. Por exemplo, com relação à intenção de privatizar “tudo o que for possível”, como vem sendo afirmado por alguns membros deste novo governo, e a de que “trabalhador no Brasil tem direitos demais” e que “precisará escolher entre ter direitos ou ter emprego”, como disse o próprio Presidente da República. Podemos dizer que, além de serem propostas que não representam o desejo da maioria da população brasileira, como mostrou pesquisa divulgada pelo Datafolha no final de semana, farão mal a toda a classe trabalhadora. Não há trabalhador que queira perder direitos. Quem defende essas medidas são os empresários. Os homens mais ricos estão entre que são mais favoráveis ao corte de direitos dos trabalhadores. Ao invés de fazer chantagem com os trabalhadores, para que eles aceitem o corte de direitos, o governo deveria implantar políticas para inibir a informalidade. Deveria investir para fazer a economia girar e gerar emprego.

 

Quais os impactos de ter a frente da gestão econômica do país uma equipe oriunda dos bancos privados?

Há a clara intenção de limitar a atuação dos bancos públicos à população mais pobre. Isso seria aceitável se não soubéssemos que, por traz deste jogo, está o interesse dos bancos privados. Eles não querem atender a esse público. Querem apenas o filet mignon, que garante maior rentabilidade, sem a concorrência dos bancos públicos no segmento. Os bancos privados não têm interesse em financiar, por exemplo, a construção de imóveis voltados à população da faixa de renda 1, com rendimento de até R$ 1.800,00/mês. Eles sempre puderam oferecer linhas de crédito para esse público, mas, como precisariam abrir mão de suas altas taxas, não têm interesse. Além do mais, não querem trazer esse público para dentro de suas agências. Sabem que essas pessoas não têm como adquirir outros produtos. E os bancos privados estão atrás de consumidores, para ampliarem ainda mais os seus lucros.

 

Já nos primeiros dias do novo governo foi anunciado o fatiamento da CEF, venda de ativos do BB e medidas que colocam em risco o papel do BNDES. Como o Sr. observa o posicionamento do governo para as empresas públicas?

Está claro o objetivo de enfraquecer as empresas públicas para depois privatizar.  As empresas públicas são sucateadas. Não há reposição de funcionários, cortam investimentos e mudam o perfil de atuação. Tudo isso prejudica o atendimento à população e o total cumprimento de suas atribuições. Mesmo assim, a população reconhece a importância das empresas públicas para o desenvolvimento e a manutenção da soberania nacional. Falam tanto em livre mercado, em livre concorrência, mas não querem que o Estado entre na disputa. Querem ganhar quanto quiserem atuando em cartel, sem o que chamam de “interferência estatal”. Querem uma reserva de mercado. O Estado precisa atuar para regular o mercado, e os bancos públicos são fundamentais para o sucesso desta tarefa. Senão os bancos farão o que quiserem. Em 2008, vimos, nos Estados Unidos e no mundo, o que acontece quando deixamos para que o mercado financeiro se autorregule. No Brasil, os bancos públicos garantiram a circulação de capital. Os privados negavam crédito e se omitiam de sua responsabilidade de contribuir com a defesa da economia e o desenvolvimento socioeconômico do país, como determina o artigo 192 da Constituição Federal. Os bancos públicos são responsáveis pela maior parte da carteira de crédito do país. A Caixa responde por cerca de 70% dos financiamentos habitacionais do país; Banco do Brasil e Banco do Nordeste são responsáveis por percentual semelhante do crédito agrícola; o investimento em infraestrutura é feito pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Sem contar o importante papel para a execução das políticas sociais do governo, como o ProUni, o Fies, o Bolsa Família, a administração dos recursos do FGTS, entre outras políticas governamentais que beneficiam o povo brasileiro e contribuem para o desenvolvimento do país. Por isso, as entidades sindicais lutam, junto com os bancários e a população, pela manutenção e fortalecimento dos bancos públicos.

 

Desde o período de campanha eleitoral a Reforma da Previdência já estava no centro das discussões da equipe de Bolsonaro. O que significará para a classe trabalhadora a aprovação da reforma nos moldes divulgados por Paulo Guedes, ministro da Economia?

A proposta deles é adotar o regime de capitalização, no qual os trabalhadores só recebem os benefícios se fizerem uma espécie de poupança. Quem não poupar porque não conseguiu, está desempregado ou trabalhando sem carteira assinada ou por conta própria, ganhando menos, número cada vez maior de brasileiros, segundo pesquisa do IBGE divulgada nesta terça-feira, nunca se aposentará. O sistema de capitalização foi adotado no Chile na década de 1980 e arruinou tanto os trabalhadores e trabalhadoras do país, que o atual governo está estudando mudanças para que seus idosos não morram à míngua. Além de penalizar os trabalhadores, não mexe nos verdadeiros privilégios, que são a aposentadoria e pensões dos militares e suas filhas, do Judiciário e dos políticos. Além disso, defendemos a cobrança das dívidas que as empresas têm com a Previdência e o fim das desonerações feitas para estas empresas. Somente depois de se fazer isso deve ser aberto um amplo debate com a sociedade para se discutir a fundo o que deve ser feito com a Previdência.

 

No ano passado, a categoria bancária conquistou um acordo que terá validade por dois anos. Não havendo a Campanha Nacional este ano, quais serão as discussões e negociações realizadas?

Em 2019, o grande desafio da categoria bancária é a garantia do emprego. A discussão deste ano será pelas mesas temáticas. A novidade da Campanha Nacional 2018 para os próximos anos foi a criação de mais uma mesa de trabalho, de relações sindicais. Nelas podemos debater assuntos específicos que não temos tempo de discutir durante a Campanha Nacional. Com nosso acordo de dois anos, estas reuniões ganham ainda mais importância. Por isso, ampliaremos nossos esforços para sairmos com avanços de cada grupo de trabalho. A mesa temática de Igualdade de oportunidades discute demandas importantes para a categoria sobre a mulher, negros, pessoas com deficiência e questões relacionadas à população LGBT. A mesa temática de segurança discute dispositivos para aumentar a segurança dos bancários nos seus locais de trabalho. A mesa temática que aborda Saúde e Condições de Trabalho estuda casos de bancários que sofram com sobrecarga de trabalho, potencializada com o corte de empregos; cobrança abusiva por metas; assédio moral e outros fatores nocivos à saúde presentes em agências e departamentos. Já a mesa temática da prevenção busca criar políticas de aprimoramento e fortalecimento do instrumento de combate ao assédio moral, estabelecimento de políticas de prevenção, considerando a natureza do instrumento, que trata da prevenção de conflitos nos ambientes de trabalho.

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