A avenida Álvaro Guimarães, em São Bernardo do Campo (SP), é um retrato de como a crise afetou os brasileiros e transformou o desemprego em uma das principais preocupações nas eleições presidenciais do próximo domingo, 7. Está localizada em uma zona industrial, um dos setores mais prejudicados pelos anos de recessão que o país experimentou entre 2015 e 2016. Lá, pelo menos três empresas (Panex, Rolls-Royce e P&G) cessaram suas atividades nos últimos quatro anos, engordando os números do desemprego na região. Já são 52.000 postos de trabalho eliminados desde 2014 na cidade que projetou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como líder sindical nos anos 80. Em todo o país são 13 milhões de brasileiros sem trabalho, quase três vezes mais do que nas eleições presidenciais de 2014. Naquele ano, o Brasil tinha a menor taxa de desemprego da história, com 4,8%. Hoje está em 12,3%.
O operador de máquinas Alexander da Silva, de 43 anos, faz parte dessa estatística. Está há dez meses desempregado, desde que foi demitido da fabricante de panelas Panex, que decidiu fechar essa unidade e concentrar as atividades na fábrica do Rio de Janeiro. Desde então, Silva tem distribuído seu currículo em outras empresas e agências de emprego, mas, até agora, só conseguiu ser chamado para duas entrevistas, e não teve sucesso. Nesta quarta-feira, 3, voltou à sede de seu antigo emprego, onde agora funciona uma fabricante de luzes para veículos, para se candidatar a uma vaga. Silva foi capaz de sustentar sua família de quatro pessoas com a indenização recebida de sua demissão. Mas, se não encontrar trabalho nos próximos três meses, não sabe como vai sobreviver. “Estou muito preocupado, porque tenho visto muitos pais como eu com dificuldade para sustentar os filhos. Tenho medo do futuro”, diz.
Silva, o único da família que tinha um emprego formal, vive em uma casa própria com a esposa, a filha e o neto de dois anos. Precisa de pelo menos 1.000 reais para pagar as contas. Está disposto a receber até a metade de seu salário anterior, cerca de 3.000 reais, para não passar necessidade. Ainda assim, tem enfrentado dificuldades para voltar ao mercado de trabalho. Primeiro, porque a crise diminuiu a oferta de empregos. Em segundo lugar, porque, depois de trabalhar 18 anos na mesma empresa, não tem as qualificações exigidas pelo mercado. Só estudou até o ensino médio e quase não participou de workshops ou fez cursos para se especializar. “Quando me demitiram, não sabia sequer preencher meu currículo. Tive que recomeçar aos 43 anos”, afirma.
A única esperança de conseguir um emprego, acrescenta, é com a ajuda de algum amigo. “Mas não consegui. Está muito difícil. Ainda tenho esperanças, mas não acredito que os políticos vão ajudar os que estão desempregados como eu.” Silva, que viu toda sua vida mudar por causa das consequências da crise econômica, decidiu anular o voto no próximo domingo. Não acredita que nenhum dos candidatos irá cumprir as promessas de recuperar a economia para que o Brasil volte a criar empregos. “Não queria nem ter a obrigação de votar no domingo. Vou lutar muito para sair do desemprego, mas não acredito na política para isso”, destaca.
Um retrato da crise
A 500 metros da sede da Panex, o vazio deixado pela multinacional fabricante de peças de aeronaves Rolls-Royce também compõe o retrato da crise. No local, onde funcionava a empresa que tinha 170 funcionários em 2014, agora trabalham apenas oito pessoas para garantir a segurança e a limpeza do espaço. O fechamento de pequenas e médias empresas na região afetou o comércio. Com menos postos de trabalho nas imediações, o número de clientes de lojas e restaurantes diminuiu. As irmãs Maria Silvia e Júnia Silvia, por exemplo, decidiram compartilhar parte do espaço onde funcionava seu restaurante com um salão de beleza. “Se vem menos gente, não faz sentido manter um espaço tão grande. Estamos sobrevivendo, mas o fechamento das fábricas diminuiu os clientes”, diz Maria Silvia. Um pouco mais adiante, José Amarildo Rodrigues conta que perdeu 40% de seus clientes assíduos nos últimos quatro anos. “Não fecho meu restaurante porque ainda tenho clientes que vêm e compram marmita, mas estou vendendo menos”, acrescenta.
O economista João Sabóia, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, explica que não há uma grande expectativa para a recuperação do emprego no Brasil no curto prazo. “Ainda estamos muito longe das taxas de desemprego que tínhamos em 2014 e levará anos para voltar a essa situação”, analisa. Segundo o professor, a mudança de presidente pode ser favorável, porque o atual mandatário, Michel Temer, não teve credibilidade ou apoio para aprovar as reformas no Congresso mas, em geral, os presidenciáveis prometeram criar empregos sem apresentar propostas confiáveis e profundas.
Embora a taxa de desemprego tenha apresentado uma ligeira melhora no ano passado, os dados são maquiados pelo grande número de pessoas que, sem conseguir voltar ao mercado de trabalho formal, entraram na informalidade. “O desemprego caiu, mas continua alto. As pessoas demitidas da indústria estão tentando conseguir alguma renda no setor informal de serviços. Embora o desemprego tenha diminuído, isso não significa que o mercado esteja empregando melhor. A informalidade é preocupante”, argumenta. Com certeza, são muitos os desafios econômicos do novo presidente. Apesar do país ter saído da pior recessão de sua história, a recuperação é bastante lenta. Segundo o Comitê de Datação de Ciclos Econômicos da Fundação Getúlio Vargas, se o ritmo de crescimento se mantiver em 0,5% por trimestre, o Brasil só voltará ao nível pré-crise em 2020.
Fonte: El País