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Inflação deve disparar em 2021 e prejudicar os mais pobres

Em 2021, com ou sem uma segunda onda do novo coronavírus, com ou sem alta de preços dos alimentos, o Brasil deve viver uma crise inflacionária que vai prejudicar especialmente as camadas mais pobres da população. Segundo especialistas, a tendência é que os chamados “preços controlados pelo governo” (fator de alívio para a inflação na maior parte de 2020) voltem a pesar no bolso dos brasileiros no ano que vem.

No dia 3 de dezembro, a Petrobras anunciou mais um reajuste de 5% do botijão de gás às distribuidoras. No ano, o bujão – combustível de maior peso na renda das famílias mais pobres – já acumula alta de 21,9% no atacado, acompanhando o aumento da cotação internacional e a variação do dólar.

A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) também surpreendeu a todos neste fim de ano, ao antecipar para dezembro a reativação da bandeira vermelha nas contas de luz. Agora, para cada 100 KWh (quilowatt-hora) consumidos, haverá uma cobrança adicional de R$ 6,24.

Antes disso, a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) determinou que o reajustes de planos de saúde adiados em 2020 sejam aplicados a partir de janeiro de 2021, de forma diluída, em 12 parcelas. Esse é um aumento de preços que pesa mais para a classe média.

Não bastassem essas altas, a partir de janeiro são esperados os reajustes do transporte público e as correções anuais das contas de luz, que devem tornar a energia ainda mais cara, para além do acionamento da bandeira tarifária. A gasolina e o diesel também devem subir no próximo ano.

“Os preços monitorados dependem de decisões governamentais. Neste ano, por conta da pandemia, existiram decisões espraiadas por todo o Brasil de atrasar reajustes, reduzi-los, mitigá-los ou até mesmo anulá-los”, explica Fabio Romão, analista de inflação da LCA Consultores. “Isso foi feito para preservar principalmente a renda das famílias menos abastadas. Dois grandes exemplos disso são a energia elétrica e a taxa de água e esgoto”, cita o economista.

O problema é a pressão do mercado para reajustar – e talvez até compensar – esses preços num cenário de crise econômica, desemprego em alta e risco de segunda onda da pandemia de Covid-19. A estimativa da LCA é de uma alta de 2,42% para os preços administrados em 2020 e de 3,70% em 2021. Antes, a projeção era de altas em torno de 1% e 4,5% respectivamente, mas o reajuste foi antecipado pela decisão da Aneel de acionar a bandeira vermelha já em dezembro.

“Neste ano, a inflação dos mais pobres ficou bem mais alta do que a geral, por conta de alimentos”, diz Maria Andreia Lameiras, economista e pesquisadora do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Segundo o Indicador Ipea de Inflação por Faixa de Renda, a inflação da população de renda muito baixa chegou a 5,33% no acumulado de 12 meses até outubro, comparada à alta, no mesmo período, de 3,92% do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), indicador oficial de inflação do País.

Na sexta-feira (4), o IPC-C1 (Índice de Preços ao Consumidor – Classe 1) da FGV (Fundação Getúlio Vargas), que mede a inflação para famílias com renda mensal entre 1 e 2,5 salários mínimos, mostrou quadro semelhante: houve uma alta acumulada em 12 meses de 5,82% até novembro, puxada por avanço de 17,06% dos alimentos no período.

“Sabemos que, no ano que vem, teremos um alívio nos preços dos alimentos. Ainda vai haver aumentos em 2021, mas em proporção muito menor”, diz Maria Andreia, citando o crescimento de safras e menor desvalorização cambial como fatores para essa mudança. “Em compensação, energia elétrica e transportes – que vão fechar 2020 com uma variação muito baixa – no ano que vem vão trazer uma variação mais alta.”

A economista lembra que esse efeito no transporte público é comum, com reajustes menores em anos de eleições municipais e correções maiores nos primeiros anos de mandato. Em 2021, esse efeito deve ser agravado pelo prejuízo bilionário e perda de passageiros do setor de transportes devido à pandemia, que poderão ser compensados na próxima rodada de ajustes.

O aluguel, outro peso importante no orçamento dos mais pobres, pode sofrer a pressão de um IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado) em alta de 24,52% em 12 meses até novembro. Por outro lado, diz Maria Andreia, o elevado número de imóveis ociosos reduz um pouco dessa pressão, com muitos proprietários aceitando reajustes mais baixos, apesar do indexador disparado em alta.

A pesquisadora destaca que um problema dos itens que vão pressionar a inflação em 2021 é que dificilmente podem ser substituídos. “No caso do gás de botijão, na pior das hipóteses as pessoas vão para fogareiro nas comunidades mais pobres. Já na energia elétrica e no transporte público, não existe essa substituição”, diz ela. “Assim como com o arroz, feijão e leite, com a energia elétrica, a pessoa pode até diminuir um pouco o consumo, mas precisa de um mínimo para garantir sua subsistência.”

O aumento desses itens se dará num momento em que a renda dos mais pobres estará desafiada pelo fim do auxílio emergencial. “O que esperamos é que, com a melhora da atividade econômica em 2021, essas pessoas consigam voltar ao mercado de trabalho, recuperando sua renda”, diz Maria Andreia. “Mas isso está muito condicionado ao que vai acontecer com a economia brasileira em 2021.”

Outro fator de incerteza, destaca a pesquisadora, é como a pandemia vai evoluir nos próximos meses. “Geralmente, as famílias mais pobres têm baixa qualificação e estão muito ligadas aos setores de comércio e serviços. E são esses setores os mais penalizados quando há um quadro de pandemia se agravando.”

Fonte: Portal Vermelho.

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