Entrevistamos a delegada sindical e funcionária da GECEX/SP do BB, Juliana Donato, sobre a luta das trabalhadoras e os desafios diante da reforma da Previdência.
Estamos passando por um período de aprofundamento da retirada de direitos da classe trabalhadora. Como isso tem refletido na vida das mulheres? As mulheres ocupam os empregos mais precários na nossa sociedade. Ganhamos menos, trabalhamos mais e temos menos direitos. Somos mais exploradas que os homens e ainda somos oprimidas pelo machismo e mais vitimadas pela violência. Para as mulheres negras e LGBTIs, a situação é ainda mais grave. Então, quando a situação piora para os trabalhadores em geral, ela piora mais para as mulheres. É isso que estamos vivenciando no Brasil neste momento. Antes mesmo de falar da retirada de direitos sociais e trabalhistas, vamos falar de um direito ainda mais básico: o direito à vida. O Brasil tem a 5ª maior taxa de feminicídio do mundo. A violência de gênero é naturalizada, expondo que vivemos numa sociedade extremamente machista. Esse machismo tem expressões concretas em todos os terrenos da vida das mulheres: em casa, na rua no trabalho, etc. A situação das mulheres hoje é de extrema vulnerabilidade.
O que mudou nas relações de trabalho para as mulheres desde que a reforma trabalhista entrou em vigor? A reforma prejudica mais os trabalhadores em pior posição no mercado de trabalho e com menos condições de negociar com os patrões, como é o caso das mulheres, em especial as mulheres negras. Prevê, por exemplo, a possibilidade de grávidas e mulheres que amamentam trabalharem em condições insalubres, ou seja, que podem fazer mal à saúde! A reforma cria também várias formas de flexibilização de jornada, como o trabalho intermitente, em que não há jornada fixa. Possibilidades de flexibilização sempre impactam mais os que estão em pior posição no mercado de trabalho. Vale lembrar também que, antes da reforma trabalhista, foi aprovada outra Lei, que libera geral o trabalho terceirizado, relação típica dos setores mais explorados, como as mulheres, que costumam ser ampla maioria em postos como os de limpeza, com alta rotatividade e salários bem baixos.
Quais os impactos para a vida das trabalhadoras, caso o projeto apresentado pelo governo para reforma da Previdência seja aprovado? A reforma da Previdência de Bolsonaro e Paulo Guedes é extremamente cruel. Se ela for aprovada, os trabalhadores terão que trabalhar literalmente até morrer, pois a idade mínima para se aposentar aumentaria para 62 anos para mulheres e 65 para homens. A expectativa de vida média no país é de 75 anos, mas, em bairros mais pobres, pode ficar em torno de 55 anos, por exemplo. A mulher já tem uma dificuldade maior para se aposentar porque ocupa trabalhos mais precários, muitas vezes na informalidade, não contando tempo de contribuição. As regras de transição propostas também prejudicam mais as mulheres do que os homens. E, além disso, as mudanças no BPC, benefício assistencial pago a idosos em situação de pobreza, também atingirá mais as mulheres. Se implementado o regime de capitalização, também quem será mais prejudicada é a mulher. Neste regime, o trabalhador “poupa” um percentual do seu salário e, ao se aposentar, será remunerado pelo que conseguiu poupar. As mulheres recebem salários menores e trabalham mais na informalidade. Serão, com certeza, as maiores prejudicadas. Mas, dito isso, é importante ressaltar que essa reforma será um desastre para todos os trabalhadores, homens e mulheres. Por isso, precisamos nos organizar para, juntos, lutarmos para impedir que ela seja aprovada.
Foi na organização da resistência que as mulheres conquistaram avanços que ao longo do tempo vem mudando a estrutura da sociedade. Qual a importância da luta das mulheres no mundo do trabalho? A organização das mulheres e a luta feminista tem uma importância fundamental para termos os direitos que conhecemos atualmente. A licença maternidade e a igualdade formal entre homens e mulheres prevista na nossa constituição são exemplos das conquistas garantidas a partir da luta das mulheres. Nunca paramos de lutar. Hoje, o movimento feminista tem um papel protagonista no Brasil. Durante as eleições presidenciais, por exemplo, o movimento #EleNão trouxe à tona o nosso grito diante dos retrocessos que temos visto em relação aos direitos das mulheres. Não podemos aceitar caladas uma ministra das mulheres que diz que meninos vestem azul e meninas vestem rosa, porque esse tipo de declaração não diz respeito somente à cor da roupa que podemos usar, mas, ao que podemos ou não fazer. E, definitivamente, nós, mulheres, não vamos aceitar que nos coloquem na caixinha cor-de-rosa e nos impeçam de sermos quem quisermos ser. Essa é a importância da luta das mulheres. Não podemos baixar a guarda, sob pena de darmos passos para trás. E esses passos para trás custam vidas.
Dentro da categoria bancária, as mulheres ao longo dos anos consolidaram um protagonismo importante. De que forma o debate feminista tem contribuído? Quais são as maiores conquistas que você pode elencar? Nós, mulheres, somos cerca de metade da categoria bancária. Desde que ingressamos nos bancos, nossa luta foi importante para avançarmos em conquistas como a licença-maternidade de 180 dias e o auxílio-creche/babá. Mas creio que avançamos muito pouco em nossa situação perto do que precisamos.
E o que ainda precisa ser conquistado pelas mulheres dentro desse espaço? Os bancos são ambientes extremamente machistas. Apesar das mulheres serem metade da categoria, e muitas vezes as mais qualificadas e escolarizadas, ainda ocupamos os piores postos e, por isso, temos os piores salários. Dificilmente você encontra mulheres em postos de direção nos bancos. Muitas vezes, somos preteridas por sermos ou por pretendermos ser mães. Aliás, há bancos que chegam a cortar o vale refeição das mulheres durante a licença maternidade, um verdadeiro absurdo! Além disso, somos as maiores vítimas do assédio moral e do assédio sexual nos locais de trabalho. É importante salientar que o machismo, que existe em toda a sociedade, também existe no movimento sindical. Precisamos urgentemente tornar o movimento sindical um espaço que acolha as mulheres e suas pautas, para que possamos avançar em nossas conquistas. Faço um convite a todas as mulheres bancárias, para que participem ativamente das atividades do dia 8 de março. Vivemos no Brasil um momento difícil, de retirada de direitos e de mais ataques às mulheres. Todas nós precisamos ser parte da resistência a esses ataques. Vamos juntas!
As opiniões expressas não refletem, necessariamente, o posicionamento da diretoria do SEEB/VCR.