Neste 21 de março, se celebra o Dia Internacional de Luta contra a Discriminação Racial. A data serve para reconhecer as conquistas de direitos sociais e reforçar a luta contra o eurocentrismo e preconceito contra negros, indígenas, orientais e todas as minorias étnicas.
A Organização das Nações Unidas (ONU), instituiu como marco o dia em que ocorreu o Massacre de Shaperville, na cidade de Joanesburgo, capital da África do Sul. Em 21 de março de 1960, 20 mil negros protestavam contra a Lei do Passe, que os obrigava a portar cartões de identificação, especificando os locais por onde eles podiam circular. Apesar da manifestação pacífica, o exército atirou sobre a multidão, matando 69 pessoas e ferindo outras 186.
De acordo com o artigo I da Declaração das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, a “discriminação Racial significa qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada na raça, cor, ascendência, origem étnica ou nacional com a finalidade ou o efeito de impedir ou dificultar o reconhecimento e exercício, em bases de igualdade, aos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou qualquer outra área da vida pública”.
Historiadores afirmam que a origem da discriminação racial no Brasil e a incorporação do pensamento eurocentrista se confunde com a chegada dos portugueses e o consequente início da exploração e da colonização dos povos nativos. Já a partir de 1501, se inicia o transporte de pessoas negras escravizadas, raptadas e vendidas para o continente americano, principalmente, pelas rotas da Guiné, Mina, Angola e Moçambique. Estima-se que mais de 12,5 milhões de africanos foram tirados à força de suas terras natais até o ano de 1870 e que 1 em cada 4 eram enviados para o Brasil, cerca de 4,8 milhões até a segunda metade do século XIX.
A nossa nação é possui maior população negra fora da África, em números absolutos. Contudo, esta parcela de brasileiros segue sendo sub-representada em todos os âmbitos da vida política, econômica e social, mesmo sendo majoritária na composição da sociedade.
Segundo os indicadores da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre os segundos trimestres de 2019 e 2022, houve elevação da informalidade, da subocupação e queda dos rendimentos, efeitos sentidos mais intensamente pelos negros. A mulher negra recebeu, em 2022, 46,3% do rendimento recebido pelo homem não negro. Para o homem negro, essa proporção foi de 58,8%.
Apesar da luta histórica do movimento negro no país, o combate efetivo contra a discriminação racial só começou a se intensificar no Brasil após a Constituição Federal de 1988, que incluía o crime de racismo como inafiançável e imprescritível.
Em janeiro deste ano, uma Lei aprovada pelo Congresso Nacional, que equipara o crime de injúria racial ao de racismo e amplia as penas, foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Agora, a injúria racial pode ser punida com reclusão de dois a cinco anos. A pena será dobrada se o crime for cometido por duas ou mais pessoas. Também haverá aumento da pena se o crime de injúria racial for praticado em eventos esportivos ou culturais e para finalidade humorística.
“A ‘negra linda’ leva consigo a condição da cor como marca. Algo que nunca se faz com alguém de cor branca. Ela ‘é linda’ e isso é incondicional. O eurocentrismo que habita em nós faz determinar o que é culto, o que é belo, nobre, de qualidade. Norteia o ‘certo’ e contribui para a proliferação de uma estranha sensação de hegemonia branca em um país de maioria negra. Em Estrangeiro, Caetano Veloso canta ‘O macho adulto branco sempre no comando’. Uma verdade posta e aceita. Penso que está firmada no inconsciente coletivo brasileiro esta ideia de Estrangeiro numa nação de ‘inferiores’ negros, mestiços, amarelos ou indígenas, daqui ou doutras Bolívias. Onde afinal nos enxergamos? Silvio de Almeida aponta a construção do racismo a partir de ideias iluministas que, através de investigações científicas, estabeleceu conceitos de diferenças de raças humanas. Argumento largamente usado como justificativa para o massacre e a dominação de ‘povos inferiores’ durante os avanços colonialistas. Em complemento, Boaventura de Souza Santos observa que, na atualidade, a articulação entre o capitalismo, o colonialismo e o hétero-patriarcado formam o lastro de manutenção do poder no mundo contemporâneo, sendo que ‘A diferença principal entre os três modos de dominação é que, enquanto o capitalismo pressupõe a igualdade abstrata de todos os seres humanos, o colonialismo e o patriarcado pressupõem que as vítimas deles são seres sem plena dignidade humana, seres sub-humanos’. Cabe então repensar nossos mais simples conceitos de aceitação, pessoal e do outro, a partir de pontos menos pretensiosos. Enquanto nos enxergarmos pela lente da cor, do gênero ou da condição social, ainda que de forma inconsciente, validaremos a reprodução de discriminações múltiplas. Modelo opressor silencioso e perene. Por fim, parafraseando uma grande amiga, nunca ocorrerá mudança enquanto apenas oprimidos lutarem por ela”, afirma Carlos Augusto do Nascimento, diretor de Raça e Etnia do Sindicato dos Bancários de Vitória da Conquista e Região.