O São João foi um dia de horror para 300 famílias que tiveram suas casas derrubadas no Acampamento Terra Nobre, localizado próximo à estrada para Barra do Choça, em uma ação de desocupação.
Mesmo em um cenário de pandemia e as baixas temperaturas vividas em Vitória da Conquista, a gestão de Sheila Lemos tomou a decisão de deixar essas famílias sem nada em um dos feriados mais importantes da cultura nordestina, onde se festeja a fartura da colheita.
A ação aconteceu ainda na madrugada, às 6h e não houve tempo nem mesmo de pegar os poucos pertences que possuíam. Assim como Herzem em seu primeiro mês de mandato, desabrigou dezenas de famílias na sua gestão. Sheila Lemos se reafirma como uma continuidade dessa política que menospreza a vida daqueles que deveriam representar.
Até o momento a Prefeitura de Vitória da Conquista não disponibilizou nenhuma assistência às pessoas que estão desabrigadas. Com isso, o Fórum Sindical e Popular se reuniu de forma emergencial para promover uma ação de arrecadação para ajudar essas trabalhadoras e trabalhadores.
O Sindicato dos Bancários de Vitória da Conquista e Região convida a categoria a apoiar essa campanha que está recolhendo doações de alimentos, cobertores, material de limpeza, roupas, agasalhos e utensílios domésticos para as famílias do Acampamento Terra.
As doações podem ser entregues diretamente no Acampamento, todos os dias, das 8h às 18h, ou na sede do SEEB/VCR, de segunda-feira a sexta-feira, das 9h às 17h.
Doações em dinheiro podem ser depositadas na conta:
Associação dos Docentes da UESB
CNPJ 13.273.859/0001-16
Banco Cooperativo do Brasil S.A. – BANCOOB (756)
Agência: 3237
Conta Corrente: 30.120-5
Confira a nota completa do Fórum Sindical e Popular:
Madrugada junina de terror em Vitória da Conquista/BA promovida pela prefeitura municipal no assentamento Terra Nobre
Os festejos juninos fazem parte da cultura nordestina. As comidas típicas, o arrasta pé, os traques e bandeirolas e a fogueirinha para aquecer o coração compõem esse cenário que permeia o nosso universo simbólico. Mas, em Vitória da Conquista, o cenário junino foi de horror para as mais de 300 famílias que viviam, há cerca de 60 dias, no acampamento Terra Nobre, localizado no Bairro Universidade, nas proximidades do anel viário da cidade.
Às 5 horas da manhã do dia 24/06/2021, ainda dormindo, as famílias foram acordadas com o barulho das máquinas da prefeitura municipal, que sem nenhum diálogo e com base em acusações infundadas, já que a prefeitura não apresentou provas, iniciou o processo de destruição das casas e dos pertences dessas famílias, que quase nada puderam salvar do pouco que possuíam. Acompanhando e protegendo as máquinas da destruição, um forte aparato policial repressor: quatro viaturas da Rondesp e um ônibus da guarda municipal, para intimidar os trabalhadores e trabalhadoras do acampamento. Sequer as plantações e animais foram poupados e, segundo relato das famílias, se os mesmos não saíssem correndo, teriam sido atropelados e mortos por esses maquinários. Relatam ainda, as dificuldades de retirar dos barracos idosos, pessoas com dificuldades de locomoção e crianças, inclusive com deficiências. Assim, ao levantar acusações, de forma ambígua, generalista e leviana de loteamento e venda ilegal dos terrenos, sem apresentar quaisquer provas, sem realizar apuração ou escutar os ocupantes do terreno, a ação da prefeitura viola o estado democrático de direito, já que houve condenação sem garantia do devido processo legal e do direito de defesa. Uma crueldade sem fim, em pleno feriado junino!
Ressalta-se que essa prática eugenista, higienista e perversa era a tônica do antecessor da atual prefeita Ana Sheila Lemos, o senhor Herzem Gusmão (que faleceu de Covid19 em março deste ano). Basta lembrar as desocupações violentas ocorridas na “Comunidade Maravilhosinha”, no “Loteamento Cidade Maravilhosa” e “Cidade Bonita”, no bairro Zabelê, ambas no ano de 2017, deixando mais de 500 famílias desabrigadas; a retirada dos artistas de rua da Praça 9 de novembro; e agora, também durante a pandemia, a retirada dos trabalhadores informais (camelôs) do terminal da Lauro de Freitas, assim como de taxistas do mesmo local.
Curiosamente, a prefeita Ana Sheila Lemos tenta se diferenciar de seu antecessor ao se apresentar com nova “roupagem”, como o “governo para pessoas”. Mas o que se observa na prática é a continuidade da mesma política eugenista e higienista de seu antecessor. Mas, de quais pessoas/classes estão falando? Certamente as classes proprietárias, que vivem do rentismo fundiário e da especulação imobiliária, mediante controle do solo urbano, da propriedade e do produto do trabalho na referida cidade; nunca da classe trabalhadora, retirada de seus espaços de trabalho e impossibilitada, minimamente, de ter acesso ao solo urbano e a moradia digna. Os atos dizem mais do que palavras!
Essa realidade de expropriação e perseguição a trabalhadores é duplamente cruel em um contexto de pandemia, provocada pelo Sars-Cov-2 e a Covid19, que já vitimou mais de 513 mil brasileiros e 23.700 baianos. Em Vitória da Conquista já são mais de 31 mil infectados e 535 mortos pela doença. Somando-se à crise do capital, a política do governo genocida de Bolsonaro, da qual a prefeita e seu partido (DEM) são seguidores, agrava a situação em meio à pandemia. O desemprego segue em alta, atingindo quase 15 milhões de brasileiros no primeiro trimestre de 2021, além de outros 6 milhões de desalentados (IBGE/PNAD-Covid, 2021), que são aqueles sujeitos que já desistiram de procurar emprego formal.
Essa realidade atinge, também, os trabalhadores conquistenses, que só nos dois primeiros meses de pandemia (março/abril de 2020) perderam cerca de 2.000 postos de trabalho, e que embora nos meses posteriores esses números tenham apresentado alguma recuperação, com a reabertura do comércio e da indústria, o que contraditoriamente expõe ainda mais os trabalhadores ao contágio, continuou em queda no setor de serviços. Sem empregos formais, a informalidade e a precarização do trabalho é a tônica que garante a reprodução social de parcelas significativas dos trabalhadores conquistenses. As famílias acampadas no Terra Nobre, podem ser consideradas como parte dessa realidade. Mas, quem são eles?
O acampamento Terra Nobre é composto por mais de 300 famílias oriundas das periferias de Vitória da Conquista. São trabalhadores que, sem acesso ao mercado formal de trabalho, vivem de atividades informais, e mesmo dos bicos. Dadas as condições impostas pela pandemia, muitos deixaram de achar emprego, ou tiveram sua pouca renda diminuída. Em uma cidade onde o controle do solo urbano é efetivo e as políticas habitacionais são paliativos que não atendem à demanda de quem precisa de um lugar para morar, a pouca ou nenhuma renda, impediu essas famílias de arcar com os aluguéis e demais despesas familiares. Organizadas pelo movimento Asterra, ocuparam um terreno da prefeitura, localizado às margens do anel viário da referida cidade há pouco mais de 60 dias. A direção do movimento Asterra, que organiza o Acampamento Terra Nobre, procurou a Prefeitura através da Procuradoria Geral do município para estabelecer o diálogo institucional em relação à pauta apresentada pelo movimento que visava discutir o déficit habitacional na cidade em função da ausência de política pública habitacional continuada por esse governo municipal.
Entretanto, sem nenhum diálogo prévio, as máquinas da prefeitura, em pleno feriado junino, chegaram e, literalmente, passaram por cima do acampamento, deixando as famílias desabrigadas. É importante salientar que, em maio deste ano, a Câmara Federal, aprovou o Projeto de Lei 827/20, que proíbe o despejo de imóveis durante a pandemia até o final deste ano de 2021. Desconsiderando essa realidade social triste e cruel da pandemia, a prefeitura de Vitória da Conquista pratica uma ação arbitrária e desumana para com centenas de famílias sem teto do município. É curioso ressaltar que há poucas horas da ação rasteira e covarde contra os trabalhadores acampados, a prefeita divulgou um áudio, em site oficial da prefeitura, chamando atenção da população conquistense dos cuidados necessários para preservar a vida durante os festejos juninos.
Segundo Sheila, “mesmo com a tradição do São João, a gente não pode esquecer que estamos enfrentando um vírus terrível, que causa a dor em milhões de famílias, tendo tirado a vida de mais de meio milhão de brasileiros e mais de 500 conquistenses. Não são números apenas, são vidas perdidas, pelas quais lamentamos profundamente”.
http://pmvc.ba.gov.br/prefeita-fala-da-importancia-de-manter-cuidados-no-são-joao/, consultado 25/06/2021.
Mas, essa máxima não serviu e não serve, quando se trata dos trabalhadores pobres, sem-terra e sem-teto de Vitória da Conquista. Como manter os cuidados de prevenção, se a própria prefeitura, ao derrubar os barracos improvisados dessas mais de 300 famílias, os jogam, literalmente, no risco direto do contágio e da morte? Fica muito claro que o governo “das pessoas” não passa de um governo “para algumas pessoas/classes”, as quais deram e dão a sustentação a esse governo nefasto para com a população trabalhadora e pobre da cidade.
Nós, do Fórum Sindical e Popular, entidade formada por movimentos sociais, estudantis, sindicatos de trabalhadores de várias categorias, partidos políticos e demais setores da sociedade conquistense, repudiamos a ação imoral e criminosa praticada pela prefeitura da cidade. É urgente que a Câmara de Vereadores, a Defensoria Pública e o Ministério Público se posicionem oficialmente e atuem com firmeza para garantir o direito à habitação digna e impedir que tais ações voltem a ocorrer.
Simplesmente jogar essas pessoas na rua, sem nenhum diálogo prévio e sem tomar nenhuma ação prévia e concreta para garantir condições de habitação dignas para elas em algum outro lugar, demonstra que falta à prefeitura municipal uma política pública habitacional voltada para as pessoas. Exigimos a suspensão imediata de quaisquer medidas de desocupação, a abertura do diálogo e que a prefeitura municipal cumpra com sua obrigação de garantir condições dignas de habitação e vida para essas trabalhadoras e trabalhadores.
Vitória da Conquista, 26 de junho de 2021.
FÓRUM SINDICAL E POPULAR DE VITÓRIA DA CONQUISTA