Nesta edição d’O Piquete Bancário abordamos a cultura do estupro, seu significado e como ela pode ser combatida. Conversamos com a advogada, professora de direito da UESB e FAINOR, doutora pela PUC/SP, vencedora do 5º Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero, Luciana Silva. Confira.
O que é a cultura do estupro? É o termo usado para designar a naturalização da violência sexual contra mulheres. Vivemos em uma sociedade na qual a mulher é inferiorizada e seu corpo é coisificado, o que favorece a ocorrência e a impunidade dos crimes contra a dignidade sexual feminina.
A cultura do estupro também está presente no ambiente de trabalho? De que forma? Sim. Essa cultura permeia os diversos campos sociais, dentre eles o ambiente de trabalho. Segundo a OIT (Organização Internacional do Trabalho, 2013), 52% das mulheres economicamente ativas, em todo o mundo, já sofreram assédio sexual. Este crime é uma das expressões da cultura machista no ambiente de trabalho. Em alguns casos a mulher prefere pedir demissão do que denunciar tal prática.
Quais são os comportamentos que contribuem para o fortalecimento da cultura do estupro? A classificação das mulheres a partir de uma moral que as rotulam como “fáceis”, “para casar”, de “família”, etc., desqualificando as que destoam do padrão patriarcal imposto. Além disso, a vinculação em propagandas publicitárias do corpo feminino com mercadorias favorecendo a visão da mulher enquanto coisa. Tudo isso fortalece a famigerada cultura do estupro.
Como essas práticas podem ser combatidas? A saída está na educação? Essas práticas devem ser combatidas com o enfrentamento constante dessa cultura em todos os campos sociais em que ela desponta. Acredito em uma mudança cultural que substitua o patriarcalismo pela igualdade entre homens e mulheres, pautando-se no respeito às diferenças. Isso passa não só pela educação formal, mas pelas práticas cotidianas de homens e mulheres em seus diversos campos de atuação.
Por que a culpabilização da vítima é tão frequente? A culpabilização da vítima é, simultaneamente, um sintoma da sociedade patriarcal e um mecanismo que reforça seus valores, fazendo com que o mesmo se remodele e se perpetue ao longo dos tempos. Por isso é tão frequente.
A Sra. acha que o estado tem cumprido seu papel de combater a violência contra a mulher? Há uma intervenção, mas ainda tímida. Faz-se necessário, sobretudo, o investimento em políticas públicas para que torne real o preceito constitucional que determina a igualdade entre homens e mulheres. Enquanto perdurar a cultura patriarcal a violência contra a mulher permanecerá em níveis alarmantes.
Hoje, graças a meios de comunicação como a internet, o movimento feminista tem alcançado um número maior de mulheres que passaram a aderir à luta. Ainda assim, são inúmeros os ataques sofridos pelo movimento. A que isso pode ser atribuído? Sintetizo em dois os fatores que, interligados, contribuem para a desqualificação dos movimentos feministas. O primeiro seria a falta de informação do que realmente são esses movimentos e do relevante papel que eles vem desempenhando ao longo dos anos. O segundo seria o próprio patriarcalismo que, para se sustentar enquanto ideologia, promove constantes ataques aos movimentos de mulheres e às pessoas que o compõem.
As opiniões expressas na entrevista não refletem, necessariamente, o posicionamento da diretoria do SEEB/VCR.