Nesta edição conversamos com o advogado do escritório LBS especialista em Gestão Pública e Especialista em Direitos Humanos do Trabalho e Direito Transnacional do Trabalho pela Universidad de Castilla-La Mancha, Antonio Megale, que abordou questões ligadas à MP 881. Confira.
No que consiste a Medida Provisória nº 881 que, após aprovada na Câmara e no Senado, segue para sanção do presidente? Quais são as armadilhas para os trabalhadores? A MP nº 881/2019 institui “a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, que estabelece normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica” (artigo 1º). Pretende que seja aplicada a vários ramos do Direito, inclusive, ao Direito do Trabalho. Nesse sentido, já se mostra incompatível e em choque com os princípios próprios do Direito do Trabalho, que não se harmoniza com uma “liberdade econômica” sem o tempero e os limites da valorização social do trabalho (as pessoas são iguais em direitos (art. 5º, caput, da CF/88), que a dignidade humana é um valor inarredável (art. 1º, III, da CF/88), que a sociedade brasileira deve ser construída de forma livre, justa e solidária, caminhando para a redução das desigualdades sociais e regionais (art. 3º, I e III, da CF/88), e que deve haver a valorização social do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º, IV, da CF/88). Resumidamente os pontos mais sensíveis e graves que foram aprovados: introduz a lógica de interpretação do Direito Comum e Econômico sobre o Direito do Trabalho; desobriga o controle formal de anotação da jornada de trabalho para empresas com até 20 empregados; autoriza o registro de ponto por exceção à jornada regular de trabalho mediante acordo individual escrito e/ou convenção coletiva de trabalho (acordo individual livra empresa da anotação dos horários de trabalho); cria a CTPS digital, com novo prazo de anotação de 5 dias úteis, e sem garantia de acesso efetivo para todos os trabalhadores acerca de suas informações (excluídos digitais que não são poucos no Brasil); dificulta a responsabilização do sócio pela inadimplência da empresa e as empresas de um mesmo grupo econômico (facilita o calote); acaba com o e-Social.
A MP nº 881 tem mesma validade para quem já está no mercado de trabalho e para os novos contratos? A MP será convertida em lei quando sancionada pela Presidência da República e entrará em vigor na data de sua publicação, exceto para os artigos 6º ao 19, que entrarão em vigor após 90 dias da data de publicação oficial. Os artigos alterados da CLT estão no artigo 15 do texto aprovado, assim, apenas vigorarão depois deste período de 90 dias da publicação. A intenção é que a lei tenha validade para todos os contratos de trabalho, os novos e os em vigor. De qualquer forma, em casos concretos, poderá se discutir o direito adquirido incorporado nos contratos de trabalho já em vigor, o que dependerá de cada caso. Há de se respeitar o art. 468 da CLT, que dispõe que, nos contratos individuais de trabalho, só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.
Como fica a garantia do descanso com a sanção dessa nova lei? Quando da votação do texto vindo da Câmara dos Deputados, em 21 de agosto, o Senado Federal retirou o artigo que permitia o trabalho aos domingos e feriados. Assim, fica garantido o repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos, conforme estabelece o art. 7º, inciso XV, da Constituição federal.
A jornada de trabalho será determinada pelo empregador diretamente com o trabalhador? A jornada de trabalho deverá seguir as regras da CLT. Apenas nas hipóteses de convenção ou acordo coletivo de trabalho poderá haver regra diferente. Negociação individual entre empregador e trabalhador somente ocorrerá no caso daqueles que recebem mais de 30 salários-mínimos, os denominados “hiperssuficientes”.
As opiniões expressas não refletem, necessariamente, o posicionamento da diretoria do SEEB/VCR.