Economista do Dieese diz que o governo quer um Bndes voltado para financiar projetos de privatizações. “É um enfraquecimento muito grande e rápido do banco”
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes) anunciou que vai se desfazer de R$ 6 bilhões em debêntures da Vale até o início de 2021. A venda de ativos do BndesPAR, braço financeiro do banco em mercado de capitais, tem se intensificado no governo Bolsonaro. Para a Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae), a ação faz parte da estratégia do governo de reduzir a participação do Estado na economia e enfraquecer os bancos públicos.
As debêntures da Vale foram adquiridas na época da privatização da Companhia, em 1997. O presidente da Fenae avalia que a venda desses papéis não é um problema. O erro, em sua opinião, é o destino deste recurso. “O Bndes é um banco de desenvolvimento. Depois que investiu em determinada empresa, como foi no caso da Vale, o banco cumpriu seu papel. Portanto, não há problema em vender as debêntures desde que este recurso seja usado para investir no desenvolvimento de outras empresas. Mas o que este governo está fazendo é simplesmente queimar nosso patrimônio, produzir um lucro artificial de curto prazo e mandar o dinheiro para o Tesouro, que vai torrar esse recurso pagando dívidas”, opina Takemoto.
Além de debêntures, o governo também quer vender parte das ações que o Bndes tem na mineradora. Em agosto deste ano, o banco de desenvolvimento já vendeu R$ 8,1 bilhões em ações da Vale, o equivalente a 2,5% do capital da mineradora. A oferta é criticada pelo economista Sérgio Mendonça, do Departamento Intersindical de Economia e Estatística (Dieese), que acredita que a medida enfraquece o próprio Estado. “Quando você tira um ente público do conjunto de ações de uma empresa como a Vale, certamente isto deve ir para a mão do setor privado, aumentando a influência deste setor no comando da Vale. Foi a mesma coisa quando a Caixa vendeu as ações da Petrobras no ano passado. É uma empresa pública que é parte do capital de outra empresa pública, neste caso. Em tese tem interesses conjuntos do acionista principal, que é o Tesouro”, explica.
Para Takemoto, estas e outras ações do governo estão colocando em prática a ideia do Estado mínimo, tão admirado e desejado por Paulo Guedes. “A intenção do Guedes é o Estado mínimo. Então ele quer destruir tudo o que for empresa estatal e começa vendendo o que é mais fácil. Vai privatizar de uma vez a Caixa e o Bndes? Não. Ele precisa disfarçar. Então vai comendo pelas bordas. Debêntures são títulos que podem ser vendidos no mercado, então ele vende tudo o que pode”, disse.
O governo faz a mesma manobra com a Caixa. Em junho deste ano o banco vendeu a participação de 3,2% na Petrobras. Em setembro, vendeu ações que detinha no banco Pan (antigo PanAmericano). Na época, o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, informou sobre sua intenção e do ministro da Economia, Paulo Guedes. “Nós vamos vender tudo o que não é estratégico, seja de uma maneira integral, seja parcial”, disse, referindo-se à Caixa.
Enfraquecimento
Takemoto avalia que as ações do governo podem deixar os bancos públicos sem capacidade para investir no desenvolvimento econômico e social do país. Apesar de a venda de ativos do BndesPar não estar amarrada ao potencial de investimentos, ele acredita que, ao diminuir a participação da Caixa e do Bndes nas empresas, o governo não está deixando os bancos mais robustos, mas enfraquecendo e diminuindo seu tamanho. “O objetivo não é vender ações da Caixa para investir na própria Caixa e aumentar crédito, fazer mais moradias. Não é isso. Ele está criando um lucro artificial do banco e levando dinheiro artificial para o Tesouro. A médio prazo está queimando patrimônio e daqui a pouco não tem mais patrimônio para queimar”.
O economista Sérgio Mendonça compartilha da opinião do presidente da Fenae. Apesar de serem operações diferentes (debêntures/ações), o plano do governo é o mesmo – “Reduzir o papel dos bancos públicos no conjunto do sistema financeiro, deixá-los menores”, disse. “O Bndes não é a mesma coisa que a Caixa pois é um banco de fomento, mas a lógica é a mesma – uma estratégia de enfraquecimento do Bndes, como é da Caixa e também do Banco do Brasil”.
O argumento da equipe econômica do governo para justificar a venda dos títulos pelo BNDESPar é focar em pequenas empresas e infraestrutura. No entanto, o banco está perdendo drasticamente a capacidade de investimento, o que compromete a retomada da economia.
No ano passado o banco registrou o menor desembolso desde 1997 – quando o volume total foi de R$ 17,9 bilhões. O desempenho dos investimentos cresceu consideravelmente a partir de 2003. Dados do Bndes mostram um forte crescimento em 2009, elevando os empréstimos para um total de R$ 136,3 bilhões. O aumento nos investimentos foi uma medida adotada pelo governo Lula para enfrentar a crise financeira internacional de 2008. Em 2013 o volume de empréstimos do banco chegou ao auge, com desembolso de R$ 190,4 bilhões. A partir de 2015 houve forte queda, chegando a R$ 55,3 bilhões em 2019 – uma diminuição de 71%, se comparado com 2013.
Para Sérgio Mendonça, os números mostram que o banco de desenvolvimento está encolhendo cada vez mais desde o governo Temer. Depois do crescimento a partir da estratégia de capitalização para enfrentar a crise de 2008, o banco está perdendo força desde 2016. “Está reduzindo fortemente de tamanho. Eles [o governo] querem que o Bndes empreste menos, que não tenha política de emprestar para as grandes empresas, embora os números sejam bastante favoráveis ao empréstimo, já que o banco e o Tesouro ganharam muito dinheiro”, avalia.
O economista também acredita que o governo está buscando reduzir o papel do Estado, dando espaço para o mercado privado. “É uma visão de diminuição do Estado. E o Bndes, que já foi um grande banco e de grande importância, agora está sendo diminuído fortemente pelo governo. Querem criar um Bndes voltado para projetos de privatização, emprestando dinheiro para empresas que queiram entrar a partir do novo marco legal do saneamento. É um enfraquecimento muito grande e rápido do banco”.
Fonte: Fenae