Em uma sessão marcada por votos constrangidos e negociação de emendas à luz do dia no plenário, Michel Temer obteve apoio suficiente para barrar o avanço da denúncia por corrupção passiva apresentada pela Procuradoria-Geral da República.
Dos deputados que compõem a Câmara, 263 votaram sim, 227 votaram não, 2 se abstiveram e se 19 ausentaram. Com a vitória do Planalto, o Supremo Tribunal Federal não está autorizado a analisar a denúncia, o que impede Temer de se tornar réu e, consequentemente, de ser afastado do cargo por até 180 dias.
A vitória de Temer, porém, foi obtida cerca de duas horas antes do fim da votação, às 22 horas. Pouco depois das 20 horas, os votos em favor do relatório da Comissão de Constituição e Justiça que recomendou o arquivamento das acusações contra o atual presidente somados aos ausentes e às abstenções resultavam em 172, o suficiente para salvar Temer do prosseguimento da denúncia.
Primeiro na linha de sucessão caso o peemedebista fosse afastado, Rodrigo Maia, presidente da Câmara, não demonstrou estar disposto a trair o atual presidente, ao contrário da postura adotada por Temer em relação à Dilma Rousseff. Na sessão, Maia beneficiou o peemedebista ao dar agilidade à votação e barrar requerimentos da oposição pelo adiamento da deliberação.
À parte aqueles que condenaram a “esquerda comunista” no microfone, os deputados que votaram “sim”, ou seja, contra o avanço da denúncia, demonstravam constrangimento de barrar as acusações. Em lugar de Deus e da família, pilares dos discursos dos parlamentares que votaram em favor do impeachment de Dilma, os deputados favoráveis a Temer evocaram a estabilidade econômica como principal motivo para suas escolhas.
O PSDB e o PSB, partidos da base governista, orientaram suas bancadas pelo avanço da denúncia contra Temer, embora a primeira legenda, que conta com quatro ministros no governo, tenha deixado seus parlamentares livres para escolherem seu voto. No caso do PSB, ocorreu uma curiosidade: a deputada Tereza Cristina (PSB-MG) orientou a bancada do seu partido a votar contra Temer, mas declarou voto favorável ao peemedebista.
A pressão popular e de movimentos sociais pela saída de Temer foi frustrante. Após o início da votação nominal, alguns manifestantes foram ao Congresso protestar contra o peemedebista, mas a adesão do ato foi baixa. Em São Paulo, houve também concentração de alguns manifestantes em frente ao escritório da Presidência, na Avenida Paulista.
Com a votação favorável, Temer escapa por ora da acusação de corrupção passiva da PGR, que só poderá ser analisada pelo STF após o fim do mandato do peemedebista. Em nome da estabilidade atual, muitos deputados utilizaram este argumento para votar contra o avanço da acusação
O atual presidente foi denunciado por corrupção passiva com base nas delações da JBS. Nas 60 páginas da apresentada ao STF contra Temer, Janot busca conectar dois conjuntos de fatos para provar a culpa do presidente.
O primeiro envolve a negociação da propina semanal feita entre representantes do grupo J&F, de Joesley Batista, e Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR). O segundo conjunto compõe o estreito relacionamento entre Loures e Temer. Para Janot, há evidências de que, ao pedir e receber propina, Loures estava atuando em nome de Temer.
Apesar da vitória na sessão desta quarta-feira 2, Temer continua na mira da PGR. Temer deve ser alvo de um nova denúncia de Rodrigo Janot, procurador-geral da República, por acusação de obstrução da Justiça.
Bate-boca e empurra-empurra
Bate-boca e agressões não faltaram na sessão desta quarta 2. Antes da votação nominal, um conflito quase chegou as vias de fato. Enquanto o deputado Paulo Pimenta (PT) discursava, ele foi chamado por aliados de Temer de “babaca”. Em seguida, o deputado Wladimir Costa (SD-PA), com dois “pixulecos” na mão, começou a provocar colegas da oposição. A confusão foi generalizada e houve empurra-empurra. “Esse desqualificado que representa a escória do golpismo’, disse Pimenta a Costa.
Deputados atiram bonecos infláveis uns nos outros enquanto o presidente da Casa, Rodrigo Maia, pedia: “Pode mostrar, mas não podem jogar”. Após a confusão generalizada, vários focos de empurra-empurra se seguiram no plenário. O deputado Bohn Gass (PT-RS) chegou a cair em meio ao conflito.
Negociações e emendas em troca de votos
Desde que foi alvo da denúncia, Temer abriu o cofre para salvar o pescoço. Apenas em emendas parlamentares, o Planalto empenhou 4,1 bilhões de reais neste ano, sendo 2,1 bilhões apenas em julho, segundo um levantamento da ONG Contas Abertas.
Durante a sessão, a negociação de emendas do governo com deputados que podem votar favoravelmente a Temer seguiu a todo vapor. O ministro da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy, licenciado do cargo para votar contra a denúncia contra o presidente Michel Temer, negociou emendas em plena votação. O deputado Henrique Fontana, do PT, denunciou a prática em sua fala no plenário.
Às vésperas da sessão, Temer não poupou esforços para garantir votos favoráveis. Na terça-feira 1º, ele encontrou-se com dezenas de parlamentares em um jantar oferecido pelo vice-presidente da Câmara, deputado Fábio Ramalho (PMDB-MG). Antes do encontro, prometeu refinanciar dívidas públicas de representantes do agronegócio em uma reunião com integrantes da bancada ruralista.
Abertura da sessão
Às 8h47, a Câmara atingiu o quórum necessário para a abertura da análise da denúncia: 52 deputados. Cerca de 20 minutos depois, Rodrigo Maia, presidente da Casa, chegou ao local e declarou aberta a sessão. A oposição entrou junto no plenário gritando “Fora, Temer” e ostentando cartazes com críticas ao “apoio comprado” do atual presidente e à sua impopularidade.
A primeira deliberação do dia foi relacionada à continuidade ou não dos debates. Com mais de 257 parlamentares presentes, a Câmara aprovou um requerimento que encerrou a discussão, o que deu maior celeridade para o início da votação nominal.
Bem-sucedida, a estratégia da base aliada era de dar o máximo de celeridade ao processo, com o objetivo de limitar a cobertura da mídia, em especial da TV Globo. Parlamentares de oposição reconheceram que erraram ao dar quórum para o início da sessão. Antes da reabertura da sessão ás 14h, já havia mais de 342 parlamentares no plenário.
A oposição tentou emplacar requerimentos que adiassem a sessão, mas foi derrotada em votação relâmpago feita por Maia. Os deputados contrários a Temer chegaram a entrar com um pedido no STF pelo anulamento da sessão desta quarta-feira 2, com a justificativa de que não foram ouvidos no plenário, mas não tiveram sucesso.
Fonte: Carta Capital