Por acordo com governo, parlamentares também derrubaram veto de Bolsonaro ao perdão de dívidas tributárias de igrejas. Com isso, renúncia fiscal do governo vai superar R$ 1 bi em 4 anos.
O Congresso derrubou nesta quarta-feira (17) o veto total do presidente Jair Bolsonaro a um projeto que abre caminho para a indenização de profissionais e trabalhadores da saúde afetados pela pandemia.
Pelo projeto, terão direito à indenização os profissionais que se tornarem permanentemente incapacitados por conta da atuação contra a pandemia da Covid-19. Em caso de morte, a indenização poderá ser paga aos familiares do trabalhador.
Entre outros pontos, o texto prevê uma compensação a ser paga pela União no valor de R$ 50 mil em uma única prestação. A lei também trata de casos em que o valor poderá ser maior.
Em um primeiro momento, o veto foi derrubado na Câmara. Depois, durante votação no Senado, os senadores rejeitaram a decisão do presidente por 73 votos a 1. Quando vetos são derrubados, os dispositivos seguem para promulgação por parte do presidente Jair Bolsonaro.
Se o presidente não promulgar no prazo de 48 horas, a tarefa caberá ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
Bolsonaro havia vetado o texto apontando entraves jurídicos como a falta de apresentação de estimativa do impacto orçamentário e financeiro, além de violação à Lei de Responsabilidade Fiscal.
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Entre outras categorias que poderão receber a indenização estão, além dos profissionais e trabalhadores de estabelecimentos de saúde, agentes comunitários de saúde, trabalhadores da assistência social, de necrotérios e coveiros.
A equipe econômica estima que o impacto nas despesas federais com as indenizações pode chegar a R$ 3,7 bilhões.
A concessão da compensação financeira estará sujeita à avaliação de perícia médica realizada por servidores integrantes da carreira de Perito Médico Federal.
Por conta da pandemia, o Congresso tem analisado vetos em sessões separadas de deputados e senadores, em vez da sessão conjunta prevista no regimento. Nesta quarta, os deputados votaram por derrubar vetos de Bolsonaro a trechos do Pacote Anticrime – a análise dos senadores foi adiada.
Anistia a igrejas
Por acordo com o governo, o Congresso derrubou um veto de Bolsonaro ao perdão de dívidas tributárias de igrejas.
Com a rejeição, templos religiosos passam a ter isenção do pagamento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Também será concedida anistia das multas recebidas por não pagarem a CSLL.
A renúncia fiscal estimada pelo Ministério da Economia é de R$ 321,61 milhões em 2021, subindo gradativamente a cada ano, chegando a R$ 383,33 milhões em 2024. No somatório do período, a anistia ultrapassará R$ 1 bilhão.
Na época do veto, o governo informou que o presidente se mostrava “favorável à não tributação de templos de qualquer religião”.
Bolsonaro sugeriu que Congresso derrubasse o seu próprio veto ao perdão de dívidas de igrejas
Segundo a Secretaria-Geral da Presidência, no entanto, o projeto teria “obstáculo jurídico incontornável, podendo a eventual sanção implicar em crime de responsabilidade do Presidente da República”.
Código de Trânsito
O Congresso também derrubou vetos do presidente Jair Bolsonaro ao projeto que alterou o Código de Trânsito Nacional. Um deles trata dos profissionais que realizam os exames de aptidão física, mental e de avaliação psicológica a quem quer tirar carteira de habilitação.
Bolsonaro havia vetado o dispositivo que restringia a realização desses exames aos médicos e psicólogos peritos examinadores com titulação de especialista em medicina do tráfego e em psicologia do trânsito.
Para o governo, “não é crível que os profissionais que não dispõem dessa titulação não possuam prática necessária para a realização de tais exames”.
Bolsonaro também tinha vetado outro dispositivo, que impunha a infratores, além de curso de reciclagem, exame psicológico para os casos de acidente grave, condenação judicial por delito de trânsito e risco à segurança do trânsito.
Com a derrubada dos vetos, essas regras também serão promulgadas e entrarão em vigor.
Lei de Diretrizes Orçamentárias
Nesta quarta, o Congresso também derrubou o veto a trechos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) 2021 que permitem a indicação de emendas por parte do relator-geral do Orçamento, de comissões permanentes do Senado e da Câmara e de comissão permanente mista do Congresso.
Na prática, essa inclusão, feita pelo relator da LDO, senador Irajá (PSD-TO), permite que os parlamentares destinem uma fatia maior do orçamento para obras e serviços em áreas de seu interesse. Atualmente, já existem emendas individuais e de bancadas estaduais com execução obrigatória pelo governo.
Ao justificar o veto, o Executivo afirmou que os dispositivos “criam novos marcadores de despesas discricionárias”, além de dificultarem o cumprimento da meta fiscal e o respeito à regra de ouro e ao teto de gastos.
As emendas parlamentares são indicações feitas por deputados e senadores para que o recurso federal seja aplicado nos redutos eleitorais deles em todo o país.
Essas sugestões são incluídas na proposta de orçamento enviada pelo Palácio do Planalto e, depois, votadas e aprovadas pelo Congresso.
Com apoio de governistas, os congressistas também derrubaram o veto a um trecho da LDO que prevê que o empenho de uma obra (a sinalização de que uma despesa será cumprida) possa incluir execuções no mesmo exercício financeiro ou dentro do prazo de validade dos restos a pagar. Na prática, isso permite a sinalização de um gasto que será executado no ano seguinte.
Ao defender o veto, o Executivo havia argumentado que o dispositivo “infringe” o princípio da anualidade orçamentária, já que “permite o empenho de uma despesa plurianual em apenas um exercício”.
A Constituição diz que a União pode deixar de realizar gastos previstos no Orçamento desde que existam “impedimentos de ordem técnica devidamente justificados”.
Entre esses impedimentos, a LDO cita a ausência de um projeto de engenharia aprovado e de licença ambiental, no caso de obras. A Câmara recuperou um ponto do texto que prevê uma exceção, o que flexibiliza a regra. O trecho permite o empenho (fase inicial da despesa), que pode significar a contratação do serviço ou a compra de materiais, mesmo sem o projeto e a licença ambiental. De qualquer maneira, esses terão de ser obtidos posteriormente.
Dessa forma, poderão ser destinados a obras, sem cumprir esses pré-requisitos, recursos de emendas individuais, de bancada, de comissões e do relator do Orçamento.
Ainda segundo o texto da LDO, despesas de capital poderão ser realizadas para a “construção, ampliação ou conclusão de obras”. Essas despesas servem como um investimento, o governo pode, por exemplo, comprar, construir edifícios, instalações.
O investimento é feito com a ajuda da iniciativa privada. A equipe econômica do governo solicitou o veto desse ponto por entender que haverá um aumento do valor transferido a empresas privadas “sem que haja obrigação de continuidade na prestação de serviços públicos por um mínimo período de tempo”. Os vetos derrubados vão à promulgação.
Fundo para ciência e tecnologia
Os parlamentares também derrubaram o veto a um trecho do projeto que proibia o contingenciamento de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Com a derrubada, ficam proibidos bloqueios desses repasses.
Contingenciamento é um mecanismo feito pelo Executivo para conter despesas. A medida é temporária mas, se não for revertida, pode se tornar definitiva ao fim da execução orçamentária daquele ano.
Ao vetar o dispositivo, o governo argumentou que isso reduziria o espaço para alocação de recursos e poderia levar ao aumento não previsto de despesas, inclusive com rompimento do teto de gastos. Entidades ligadas a pesquisas no país criticaram o veto, afirmando que iria na contramão da demanda da ciência brasileira.
O Congresso, porém, manteve veto ao trecho que permitiria repassar para 2021 os recursos do fundo contingenciados em 2020. Segundo o Executivo, a medida obrigaria a imediata execução de cerca de R$ 4,3 bilhões e forçaria o cancelamento de dotações orçamentárias de outros ministérios.
Mais vetos
Assim como os deputados, os senadores, por acordo, também derrubaram nessa mesma votação vetos de Bolsonaro a trechos das seguintes leis:
- lei sobre o adiamento e o cancelamento de serviços, de reservas e de eventos dos setores de turismo e de cultura em razão da pandemia;
- Política Nacional de Pagamentos por Serviços Ambientais;
- reestruturação de carreiras;
- regime tributário às construtoras do programa Casa Verde e Amarela;
- Lei de Falências;
- regras para o pagamento com desconto de precatórios federais e acordo de litígio contra a Fazenda Pública durante a pandemia da Covid-19;
- lei que determina como deverá ser aplicado o dinheiro do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust). Na votação, foi retomado um dispositivo que obriga a implementação até 2024 de internet banda larga em todas as escolas públicas do país, principalmente naquelas fora das zonas urbanas.
Os vetos derrubados vão à promulgação.
Remanejamento de recursos
Os senadores também aprovaram um projeto de lei, enviado pelo governo na segunda-feira (15), que flexibiliza a execução dos gastos federais enquanto o Legislativo não aprova o Orçamento de 2021. O texto já havia sido aprovado pela Câmara e vai à sanção.
A proposta permite o uso do “superávit financeiro” (dinheiro que estava vinculado e não foi usado em 2020) para pagar despesas que, hoje, estão travadas.
Segundo exposição de motivos para o projeto, assinada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, entre as despesas estão a folha de pagamento de pessoal ativo de alguns órgãos e entidades do Poder Executivo, os precatórios, as aposentadorias e pensões do Regime Geral de Previdência Social, e os serviços públicos essenciais, como a operação carro pipa no semiárido brasileiro.
O relator da matéria, senador Fernando Bezerra (MDB-PE), que é líder do governo no Senado, afirmou nesta quarta ser “perfeitamente razoável que a União inicie o exercício financeiro sem PLOA promulgado”.
Fonte: G1