A pandemia do novo coronavírus colocou o Brasil diante de múltiplos desafios. Os mais prementes são tomar todas as medidas necessárias para salvar vidas e minimizar o quanto possível os efeitos danosos do alastramento do contágio, como o colapso do sistema de saúde, e criar as condições básicas para a preservação dos empregos e da renda dos trabalhadores.
Há um falso debate, imposto por uma insana disputa política capitaneada pelo presidente Bolsonaro, que pretende contrapor duas tarefas que devem ser executadas ao mesmo tempo. É impensável que haja possibilidade de recuperação econômica em um país devastado pela morte; por outro lado, não há como se antever a saída sem estímulos do Estado nacional para a salvaguarda dos setores econômicos e a preservação dos empregos e da renda. São agendas concomitantes em qualquer lugar do mundo, e devem sê-lo aqui também.
Nesse contexto, a Medida Provisória 936, que trata do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, autoriza reduções de jornadas de trabalho e de salários, mediante complementação de parte das perdas pelo Tesouro Nacional.
É importante dizer que, por si só, a previsão de reduções de salários já representa um importante apoio para as empresas, até porque demissões têm custos financeiros imediatos e futuros, para o momento da retomada, com novas contratações e treinamentos. Além disso, há outras medidas, corretas a meu ver, relativas à facilitação de crédito e diferimento de impostos.
No que diz respeito aos trabalhadores, a proposta do governo é tímida nas soluções, condicionada por uma concepção fiscalista do gasto público que não tem lugar no momento e, em muitos aspectos, regressiva para os empregados. Designado relator do texto, tenho procurado construir uma maioria política para minimizar as perdas salariais, particularmente para aqueles que ganham menos.
Uma pedra angular do meu relatório é preservar os vencimentos dos trabalhadores que ganham até 3 salários mínimos ou R$ 3.135. Convenhamos, não é muito. Quem sustenta uma família com esta renda praticamente não tem como fazer poupança, o dinheiro retorna todo para girar a roda da economia, via consumo e impostos. Não faz sentido – é recessivo, inclusive – que trabalhadores com renda mais baixa tenham seus vencimentos ainda mais achatados.
Há impacto fiscal? Sim! Pequeno, diante do benéfico impacto social que proporciona. Ademais, chega a ser ínfimo se comparado aos pacotes econômicos feitos por governos de outros países.
Outra questão relevante é colocar as entidades sindicais na mesa de negociação com as empresas. É uma covardia sem tamanho querer que o trabalhador individualmente negocie com o patrão em uma situação absolutamente excepcional como a pandemia, que objetivamente traz custos econômicos e efeitos perversos como o desemprego.
Além do mais, é pacífico que toda norma jurídica exige interpretação conforme a Constituição para ser válida. A CLT, por exemplo, já prevê, em seu artigo 503, a possibilidade de redução salarial em até 25% em casos de “força maior”, entendido como acontecimento inevitável em relação à vontade do empregador. Mas isso sempre foi feito mediante convenção coletiva, porque o artigo 7º, inciso VI, da Constituição Federal é expresso ao garantir a “irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo”.
Também é nossa intenção garantir a manutenção dos rendimentos das trabalhadoras gestantes. A ideia é que a grávida que tiver redução de jornada ou contrato suspenso com a redução de vencimentos prevista no programa, assim que solicitar o salário-maternidade, passe a perceber o valor anterior ao afastamento, ou seja, do contrato original.
Em política, sempre que possível, creio e trabalho pelo entendimento, desde que este não seja um entendimento contrário ao princípio básico da justiça social, que é cuidar primeiro de quem mais precisa. Minha relatoria não é contra o governo, é a favor de prioridades claras: salvar vidas, viabilizar empresas, garantir os empregos e a renda dos trabalhadores – essa é a única maneira de retomar a economia.
Fonte: CTB