Um levantamento realizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, a Apib, mostra que a pandemia de COVID-19 se espalha pelas aldeias e o número de seus membros mortos já ultrapassa a casa dos mil.
A Sputnik Brasil ouviu um representante do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Fundação Nacional do Índio (Funai) para saber mais sobre como está sendo gerenciada a ajuda a esses povos para o combate à pandemia.
Segundo a Apib, já foram registrados 1.039 óbitos e mais de 52 mil indígenas — distribuídos entre 163 povos — tinham sido infectados com a doença. A média é de três mortes por dia, informa o levantamento do órgão, divulgado pouco antes desse dia 19 de abril, quando se celebra o Dia do Índio.
Pandemia entre os indígenas
Gilderlan Rodrigues da Silva, coordenador regional do Cimi no estado do Maranhão, disse que a situação dos povos indígenas hoje, por conta da expansão da pandemia, é muito delicada, pelo fato de nem todos ainda terem sido vacinados.
Um dos gargalos para a distribuição de ajuda e vacinação contra a COVID-19, segundo ele, é a distância e o acesso às terras indígenas. Há um esforço muito grande por parte do Cimi para que esses povos não saiam de seus territórios e que sejam feitas barreiras sanitárias, com o intuito de impedir o avanço da doença entre as tribos.
Questionada sobre como está agindo para combater a pandemia e evitar o contágio dos indígenas, a Funai respondeu através de uma nota à Sputnik Brasil que, no âmbito de suas competências, tem dado toda a atenção e o suporte necessários para que as comunidades possam passar pela pandemia da melhor forma possível.
“A Fundação tem superado diversos desafios logísticos de Norte a Sul do país para que as cestas de alimentos cheguem às aldeias, sobretudo nas áreas mais remotas. Em muitos lugares o acesso é difícil, principalmente em locais onde há floresta e mata fechada. Há aldeias em que a chegada é possível apenas de barco ou avião. Nesses casos, deve haver um planejamento minucioso para que as ações sejam cumpridas de forma efetiva e segura”, continuou a nota da Funai.
Ao todo, a Funai já investiu R$ 46 milhões em ações preventivas, com destaque para o suporte a cerca de 300 barreiras sanitárias, a fim de impedir o ingresso de não indígenas nas aldeias. Ainda no mês de março de 2020, a fundação já havia suspendido as autorizações para ingresso em terras indígenas, disse o órgão na nota.
Sobre a vacinação dos povos indígenas e demais questões envolvendo a saúde indígena, a Funai esclareceu na nota que o responsável pelo assunto no país é o Ministério da Saúde, que o órgão não cuida diretamente da matéria, mas sim a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai/Ministério da Saúde), que possui a competência institucional de coordenar e executar a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas e todo o processo de gestão do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS) no Sistema Único de Saúde (SUS).
Os indígenas foram incluídos pelo Ministério da Saúde na primeira fase dos grupos prioritários do Plano Nacional de Imunização (PNI) contra a COVID-19. Relatório das ações realizadas pela Sesai para enfrentamento da pandemia do novo coronavírus — em versão atualizada em 9 de abril — traz dados sobre porcentagens de indígenas imunizados, apontando que cerca de 295 mil indígenas receberam pelo menos a primeira dose.
Ajuda aos povos indígenas
De acordo com Gilderlan, os indígenas têm tido também certo apoio de alguns governos estaduais e municipais pelo Brasil a fora em termos de distribuição de cestas básicas, mas que infelizmente isso foi visto somente no ano passado, e que agora pouco apoio tem sido dado.
“Por conta disso, o representante do Cimi explicou que “muitos povos, nesse momento, estão fazendo suas próprias roças, para produzir sua alimentação, por entenderem que não dá para depender exclusivamente das cestas básicas, que foram bastante reduzidas”.
A Funai informou que já entregou aproximadamente 600 mil cestas básicas a famílias indígenas durante a pandemia, o que representa cerca de 13 mil toneladas de alimentos distribuídos. Segundo o órgão, a medida “garante a segurança alimentar de milhares de indígenas no país, contribuindo para o isolamento social e para evitar o risco de contágio pela COVID-19”.
Outro problema assola a população indígena e suas terras: “A invasão de seus territórios aumentou, colocando-os em situação de vulnerabilidade, então há uma preocupação muito grande com essa situação que eles estão vivendo, junto com a falta total de apoio por parte dos governos nesse quesito”, explicou Gilderlan.
Em contraste com essa afirmação do representante do Cimi, a Funai disse que, no âmbito da proteção da territorial, desde o início da pandemia foram realizadas 306 ações em 221 terras indígenas para coibir ilícitos, como extração ilegal de madeira, atividade de garimpo, além de caça e pesca predatórias, a um custo de R$ 12 milhões, realizadas em parceria com outros órgãos, como Exército e Polícia Federal. Também foram executadas 11 expedições de localização e monitoramento de índios isolados.
Atuação do Cimi e da Funai
Gilderlan afirmou que o Cimi tem buscado estar junto dos povos indígenas nesse momento difícil através da doação de kits de higiene e itens de alimentação, além de apoio na produção das roças, na proteção dos territórios, na realização de denúncias, na cobrança da vacinação para esses povos, tanto os que estão em território demarcado como os que estão vivendo no contexto urbano.
O órgão tem buscado ajudar esses povos, continuar sua missão junto a eles “por entender que o momento é bastante complicado e que se faz necessária essa presença, essa escuta, também essa cobrança para que haja prioridade para os indígenas”, continuou o representante do Cimi.
Ele frisou que o Cimi tem lutado junto as organizações indígenas para que os povos tenham a sua produção necessária de alimentos, acesso às vacinas e na manutenção de seu modo de vida tradicional.
A Funai, por sua parte, diz promover o etnodesenvolvimento e a autonomia indígena, e para isso foram investidos R$ 18 milhões em ações que visam a autossuficiência das comunidades, como a aquisição de materiais de pesca, sementes, mudas, insumos, ferramentas e maquinários agrícolas. A intenção do órgão é fazer com que os indígenas mantenham a produção, além de colaborar para que, no pós-pandemia, as etnias invistam em processos de geração de renda e fortaleçam sua cultura.
Fonte: SPUTNIK NEWS