Segundo estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgadas na terça-feira (5) a dívida pública brasileira encerrará o ano de 2020 em torno de 100% do Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e dos serviços produzidos) e permanecerá em níveis semelhantes no médio prazo.
A projeção deve ser lida como mais um atestado do fracasso do regime fiscal imposto ao país pelo golpe de 2016, cujo fundamento é o teto dos gastos, uma aberração em matéria de política econômica sintonizada com as receitas do FMI e os interesses do sistema financeiro.
O teto, derivado da EC 95 que congelou as despesas públicas primárias por 20 anos, foi justificado pelo governo Temer como uma medida indispensável ao equilíbrio das contas públicas. Registre-se que o pagamento dos juros da dívida pública, que consomem cerca de 50% do Orçamento da União e são a principal causa do desequilíbrio fiscal, não sofre qualquer restrição. Os lucros auferidos por banqueiros e rentistas são sagrados.
O país amargava, à época, a ressaca da severa recessão de 2015 e 2016 e o rigor fiscal foi adotado com a promessa de que atrairia um tsunami de investimentos privados, destacadamente estrangeiros, em volume mais do que suficiente para cobrir os cortes nos investimentos públicos.
Lembre-se que a mesma conversa fiada temperou a aprovação das reformas trabalhista e Previdenciária, assim como outros retrocessos contra a classe trabalhadora e o povo brasileiro verificados ao longo dos últimos quatro anos.
O tempo já mostrou que as promessas não passaram de ardilosos pretextos. O Brasil não viu sequer uma marolinha de investimentos privados no período. Sem investimentos públicos a economia brasileira caminhou da recessão para a estagnação.
Hoje, sob a pandemia do coronavírus, o país é castigado pela depressão, com dezenas de milhões no desemprego e menos da metade da População em Idade Ativa (PIA) ocupada, segundo o IBGE.
A crise amplia a necessidade de gastos públicos ao mesmo tempo que reduz a arrecadação de impostos e, por consequência, a receita dos governos. O resultado desta equação é a expansão do déficit e da dívida pública.
A relação dívida/PIB era de cerca de 66% no início de 2016. Não parou de subir desde aquele fatídico ano. Alcançou 81,9% em maio de 2020 e, se as previsões se confirmarem, deve saltar para 100% do PIB até o final do ano. Por ironia, o teto dos gastos bolado para reduzir o rombo contribuiu para sua expansão e é apontado por muitos economistas como a principal causa da crise.
Qualquer observador que não esteja obcecado pela utopia reacionária do Estado mínimo é capaz de deduzir que os cortes infindáveis nos investimentos e gastos dos governos, além de precarizar os serviços públicos e sacrificar as universidades e a ciência, deprimiu a economia e reduziu a arrecadação.
Foi como um efeito bumerangue, que retornou na direção contrária ao alvo contra o qual foi lançado. Na prática o teto dos gastos foi desmoralizado e violado na crise, que induziu o Congresso a aprovar um orçamento de guerra para combater a pandemia.
Porém, a excrescência sobrevive na legislação. É uma fantasia neoliberal conveniente ao governo da extrema direita, que dela se vale para justificar a ofensiva contra os direitos do povo, as conquistas democráticas e a soberania nacional.
Texto de Umberto Martins
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