O total de brasileiros contaminados pelo novo coronavírus (Covid-19) não para de crescer e o cenário é o mesmo no mundo. No Brasil, as secretarias de Saúde dos estados informaram, na noite desta terça-feira (24), que 2.271 casos já foram confirmados e 47 pessoas morreram vítimas do Covid-19, sendo 40 em São Paulo, seis no Rio de Janeiro e um no Amazonas. Hoje cedo, agências de noticias falaram de mais uma morte no Rio Grande do Sul.
Neste cenário de emergência sanitária, os trabalhadores e as trabalhadoras da saúde que estão na frente da linha de batalha denunciam que estão trabalhando sem Equipamentos de Proteção Individuais (EPIs), como máscaras e álcool gel e, portanto, estão arriscando às suas vidas para salvar outras, além de colocarem em risco seus familiares.
A secretária Nacional da Saúde do Trabalhador da CUT, Madalena Margarida da Silva, condena o governo federal e os estaduais e corrobora a denuncia dos profissionais da saúde. Segundo ela, os governos estão condenando os trabalhadores e as trabalhadoras da saúde e também toda a população.
“Praticamente em todos os estados está faltando EPIs e eu entendo que sem os equipamentos de proteção, o governo condena os profissionais da saúde e a população a se contagiar com o vírus, adoecimento e até a uma possível morte”.
E a dirigente fala isso baseada em informações de centenas de sindicatos de trabalhadores e trabalhadoras na saúde em todo país, que estão recebendo denúncias da categoria alertando que os governos, associações filantrópicas, empresas terceirizadas não estão oferecendo equipamentos de proteção e, às vezes, nem sabão para lavar a mão os trabalhadores têm.
Esta falta de proteção do Estado ignora orientações do Ministério da Saúde e da Norma Regulamentadora (NR) nº 32, que estabelece que os EPIs sejam fornecidos de forma gratuita ao trabalhador para o desempenho de suas funções dentro da empresa que seja pública ou privada, inclusive em situações de exposição a riscos para a saúde do profissional como: riscos biológicos, químicos e da radiação ionizante, como a que estamos vivendo.
“Garantir medidas protetivas e de promoção da saúde de médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, trabalhadores da limpeza e demais trabalhadores envolvidos no enfrentamento a pandemia, de acordo com sua necessidade, é papel do estado”, afirma Madalena, que complementou: “É fundamental dar condições para que estes trabalhadores possam atender a população de forma adequada e em segurança”.
“Não podemos aceitar que estes trabalhadores e trabalhadoras que em sua maioria são mulheres, donas de casa responsáveis pela manutenção da vida de suas famílias adoeçam por falta de proteção.”
Denúncias e ações dos sindicatos
Sindicatos, Federações, Confederações de trabalhadores da saúde todo país, além de implantar canais de denúncias para a categoria, têm atuado fortemente na defesa dos direitos junto aos poderes de todas as esferas.
Caos em São Paulo
O Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de São Paulo (Sindsep) tem recebido diariamente relatos de trabalhadores de hospitais que não estão fornecendo os EPIs básicos para o atendimento e os servidores afirmam que sempre faltou, mas agora nesta pandemia do novo coronavírus ficou ainda pior.
“Se não temos EPI adequado e suficiente sem casos de Covid-19, imagine agora. Não temos vestiários, armários, álcool gel suficiente, máscaras adequadas e os demais EPIs. Como vamos nos preparar, nos precaver? Uma máscara por funcionário no plantão! Somos linha de frente, sim, mas também temos famílias em casa”, apelou uma servidora que pediu a ajuda do sindicato.
O Sindsep tem atuado fortemente na defesa destes trabalhadores e depois de diversas cobranças feitas ao prefeito da cidade, Bruno Covas (PSDB), a Secretaria Municipal de Saúde vai criar uma Mesa Técnica com sindicatos para discussão e acompanhamento da evolução da epidemia do Covid-19, visando amplo debate.
O Sindicato dos Enfermeiros do Estado de São Paulo (SEESP) tem seguido a mesma linha do Sindsep. Segundo a presidenta da entidade, Solange Caetano, o sindicato também tem recebido inúmeras denúncias de profissionais até de outras categorias, da capital e de várias cidades do interior, sobre a falta de equipamentos de proteção, como falta de máscara, álcool gel, e até de casos de enfermeiros e médicos internados na UTI em observação ou para tratamento, mas que não podem identificar de onde são em para eles não sofrerem represálias.
“Já estamos entrando com uma Ação Civil Pública para tentar garantir que os profissionais de saúde recebam os equipamentos para poder se proteger e dar uma assistência segura aos pacientes e também se sentirem seguros. Porque se o profissional se sentir inseguro, cansado e estressado ele não consegue prestar um serviço de qualidade e nem atender a população da melhor forma possível”, afirmou.
O Coordenador do Fórum de Saúde dos Trabalhadores de São Paulo, Valdomiro Marques, disse que os trabalhadores da ala administrativa, agentes comunitários de saúde, agentes de combate à endemias, agentes de políticas ambientais, bem como vigilantes e porteiros também sofrem a mesma situação de estarem expondo suas vidas em um momento em que tanto precisamos da categoria.
“Esses trabalhadores, bem como toda a população, encontram-se em pânico, estão mentalmente exauridos, muitos falam em solicitar exoneração, demissão dos cargos, e isso tudo é muito preocupante”, denuncia Valdomiro.
Luta por equipamentos virou caso de perseguição em Pernambuco
O Sindicato dos Enfermeiros no Estado de Pernambuco (SEEPE), na luta por equipamentos de proteção, tem dialogado diariamente com o Ministério Público para repassar as denúncias que chegam à entidade.
Segundo a presidenta do sindicato, Ludmila Medeiros Outtes Alves, vários trabalhadores e trabalhadoras da saúde têm se negado a trabalhar sem proteção baseados no código de ética na resolução do Conselho Federal de Enfermagem (CFE), que determina como direito do profissional de saúde recusar o atendimento quando não tem os equipamentos necessários.
Ela contou que o governo caracterizou isso como greve e usou a justiça para declarar a inconstitucionalidade da suposta paralisação e até perseguida ela está sendo.
“Dois caras foram armados na minha casa no domingo à noite para me procurar, como eu não estava só disseram que eram policiais civis. Para mim foi uma intimidação pela nossa luta”, afirmou a sindicalista.
“A gente não quer deixar de trabalhar, a gente sabe da nossa importância deste momento do controle da pandemia e quanto à enfermagem é fundamental para a saúde pública e privada do modo geral, em qualquer momento. A gente só quer proteger nossas vidas”, ressaltou Ludmila.
Ameaças aos trabalhadores do grupo de risco no Ceará
Muitas denúncias têm sido feitas no Ceará, mas a principal delas é referente aos servidores com mais de 60 anos, da rede pública estadual, que tem doenças e que não sendo liberados e ainda precisam conviver com a falta de EPIs.
“Pela falta de concurso público, os servidores já atingiram uma certa idade e apresentam doenças como hipertensão e diabetes e fazem parte dos trabalhadores mais vulneráveis e muitas vezes trabalham com duas máscaras simples, a cada plantão de 12 horas e só recebem o kit se o paciente for diagnosticado com o Covid-19”, denuncia um trabalhador da rede estadual de saúde do Ceará que não quis ser identificado.
Luta pela revogação da EC 95, medida que congelou recursos para saúde e educação por 20 anos
Funcionárias do Hospital Albert Sabin, do Hospital Geral de Fortaleza e do Hospital Mental de Messejana, que não quiseram se idenficar com receio de represálias, disseram que o Sistema Único de Saúde (SUS) vem sendo precarizado há muito tempo e, segundo elas, um dos maiores ataques à saúde é a Emenda Constitucional (EC) nº 95, conhecida como teto dos gastos, e a EC 88 (do Estado do Ceará), que desviam recursos para a dívida com os banqueiros, em detrimento da saúde.
“A chegada do coronavírus expôs uma situação que vinha sendo mascarada. É preciso exigir a imediata revogação destas ECs para evitar a catástrofe com os trabalhadores da saúde e toda população”, ressaltam.
Rio Grande do Sul já aderiu a MP 927/2020
Denúncias de falta de EPIs também estão feitas aos sindicatos no Rio Grande do Sul e a Federação de Trabalhadores da Saúde no Estado (FEESSERS) também tem feito seu trabalho de cobrar e denunciar aos órgão públicas a desproteção destes trabalhadores, e não é de agora.
Segundo o presidente da federação, Milton Klempfer, a entidade já tinha conhecimento deste problema mas foi agora na pandemia do novo coronavírus que isto ficou mais visível e mais urgente.
Mas Milton alerta sobre outro problema que também está acontecendo no sul e no extremo sul do estado, como as negociações individuais com os trabalhadores, sem a participação do sindicato, como permite a MP 927/2020, emitida pelo governo Bolsonaro (sem partido) esta semana.
“A parte patronal, representada pela Federação dos Filantrópicos, maior rede de assistência do Rio Grande do Sul, está baixando normas, não estão respeitando acordos coletivos, está retirando direitos dos trabalhadores e estão adiantando férias e licença-maternidade e usando banco de horas para que os grupos de risco fiquem em casa”, denuncia Milton, que complementa: “e os profissionais que continuam trabalhando mais sobrecarregados ainda e a tendência é tudo piorar se nada mudar, porque se os casos aumentarem o Rio Grande do Sul não tem estrutura para suportar”.
Fonte: Contraf-Cut