O Tesouro Nacional avisou que não cobrirá um buraco de R$ 18,3 bilhões no caixa do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), que é responsável pelo pagamento de benefícios sociais como seguro-desemprego e abono salarial.
No ano passado, esse Fundo foi impactado com a queda da arrecadação por causa do aumento do desemprego. Além disso, a reforma trabalhista acabou com a obrigatoriedade da contribuição sindical, o que também irá afetar a arrecadação do FAT.
E a conta deverá ficar para o BNDES. Se consumado, será mais um desfalque que o governo federal irá impor ao principal banco público de fomento à economia, reduzindo ainda mais sua capacidade de financiamento ao setor produtivo.
Some-se a esse montante três liquidações antecipadas (devoluções) que o BNDES teve de fazer ao Tesouro Nacional desde que Michel Temer assumiu o poder: uma no final de 2016 e mais duas em 2017 totalizando R$ 150 bilhões.
“Regra de ouro” – Este ano, o Tesouro quer a devolução integral de mais R$ 130 bilhões a fim de cumprir a chamada “regra de ouro” – que impede a União de captar recursos no mercado em volume superior a investimento.
“Em um momento em que o país atravessa uma fase de recessão, esse recursos poderiam fortalecer o capital do banco e sua capacidade de financiar a economia a fim de reverter a crise”, argumenta Thiago Mitidieri, economista do BNDES e presidente da Associação dos Funcionários do BNDES (AFBNDES).
Além disso, esses empréstimos do Tesouro ao BNDES eram de longo prazo e estavam previstos para serem devolvidos entre 2030 e 2040. Mas o governo cobrou a liquidação antecipada em menos de dois anos, o que prejudicou a capacidade de crédito do banco.
Mitidieri ressalta que o artigo 37 da Lei de Responsabilidade Fiscal proíbe expressamente as liquidações antecipadas. Entretanto, o governo se baseia em um parecer do Tribunal de Contas da União que entende o contrário.
A Contraf-CUT e os sindicatos dos bancários de São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro ingressaram com uma representação no Ministério Público Federal questionando essas operações.
Bancos privados de olho – Para a AFBNDES, essas liquidações antecipadas integram um movimento que visa enfraquecer o BNDES a fim de beneficiar os bancos privados. O fim da taxa de juros subsidiada do banco, que entrou em vigor este mês, ajuda a corroborar a tese.
E os bancos privados já estão se aproveitando do vácuo causado pela diminuição do BNDES. Segundo fontes no Itaú BBA ouvidas pelo jornal O Globo, os recursos destinados a projetos de infraestrutura cresceram 70% entre 2016 e 2017. Os juros cobrados serão os de mercado, muito mais altos que os ofertados pelo BNDES, o que irá penalizar o setor produtivo em benefício dos bancos privados.
“Claramente, temos percebido na nossa carteira clientes que tem interesse em estudar outras alternativas além do BNDES. Antes, isso não existia, porque a diferença de juros cobrados pelo banco de fomento e pelo mercado era muito gritante”, disse ao mesmo jornal Edson Ogawa, superintendente executivo de Project Finance do Santander.
Encruzilhada fiscal – Para o professor de economia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) Antônio José Alves Júnior, além de ser uma estratégia a fim de esvaziar o banco público, as liquidações antecipadas são também uma consequência da política fiscal recessiva adotada pelo governo Temer que impede o aumento dos investimentos devido à aprovação Emenda Constitucional 95 – um dos principais objetivos da atual gestão, que irá congelar os gastos públicos pelos próximos 20 anos –, em conjunto com a “regra de ouro”.
“O governo se meteu em uma encruzilhada fiscal. Temer poderia rever a Emenda Constitucional 95 ou suspender temporariamente a ‘regra de ouro’, só que o sistema financeiro foi para cima e por isso ele adotou para 2018 uma solução que agrada o mercado financeiro, porque de um lado continua mantendo o governo amarrado no campo fiscal e de outro, esvazia o poder de financiamento do BNDES diminuindo o peso do setor público.”
Junto com João Sicsú, também professor de economia – mas da Universidade Federal do Rio de Janeiro –, Alves Junior é autor da cartilha produzida pelo Sindicato Em Defesa dos Bancos Públicos – Verdades e Mentiras.
O governo cogitou suspender a “regra de ouro”, ideia logo abortada diante das reações negativas da imprensa hegemônica. “A mídia divulgou que flexibilizar a ‘regra de ouro’ representaria uma porta aberta para o descontrole fiscal, o que é uma bobagem, porque o Brasil não é dos países mais endividados do mundo. Ao contrário, o país tem uma situação fiscal de razoável para boa”, sustenta Alves Junior.
Segundo o economista, o problema fiscal do país tem a ver com baixo crescimento da economia, o que prejudica a arrecadação. “Para o ano de 2018 não há nenhum elemento que garanta que a economia irá retomar o crescimento, porque não há aumento do investimento público; as exportações cresceram porque o preço das commodities se recuperou no mercado internacional, mas não há nenhum sinal de crescimento sustentado. Portanto, não há por que esperar a retomada da arrecadação”, afirma Alves Junior.
Fonte: SP Bancários.