Ao menos 44% das mortes por coronavírus não entrariam no boletim diário caso o Ministério da Saúde mudasse a metodologia para informar o número de novos óbitos a cada dia.
Na semana passada, a pasta anunciou que pretende mudar o modo de divulgar os dados, informando como novas mortes o número de pessoas que efetivamente morreram nas últimas 24 horas.
Desde o início da pandemia, o ministério utiliza como parâmetro a data de notificação, padrão adotado na maioria dos países.
Além disso, há um descompasso entre a data da morte, o resultado do teste e a efetiva notificação dos casos, processo burocrático que por vezes leva alguns dias, especialmente quando há finais de semana e feriados.
Esse atraso aumenta a porcentagem de mortes que só são contabilizadas dias depois e que só posteriormente entrariam no sistema de divulgação do ministério, ficando inicialmente de fora do boletim diário.
Com isso, há o risco de que se tenha a falsa impressão de que os óbitos estão em queda e medidas de prevenção sejam relaxadas indevidamente, aumentando a contaminação.
O governo começou a falar em mudar a metodologia de divulgação após o Brasil bater recordes seguidos de mortes.
Nesta quinta (11), o país ultrapassou a marca dos 40 mil óbitos. Hoje, a Covid-19 já mata mais que doenças cardíacas, câncer, homicídios ou acidentes de trânsito.
O governo também ameaçou sonegar dados e deixou de divulgar os totais acumulados de casos e mortes, medida que teve que abandonar após determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal
Por dias, atrasou a publicação dos boletins diários, dificultando a divulgação dos números nos telejornais. Houve ainda confusão nos registros, e números contraditórios foram informados no último domingo (7).
O ministro interino, general Eduardo Pazuello, compareceu na terça à comissão externa da Câmara que monitora as ações de combate ao coronavírus para prestar esclarecimentos sobre a falta de transparência na divulgação dos dados.
Ele defendeu a mudança proposta e disse que “o que interessa é o registro sanitário”.
“E, quando você lança o óbito, ele será inserido na data do óbito. O modelo anterior nunca me agradou. Não eram dados puros para uso dos gestores”, disse.
Na sessão, deputados defenderam que o ministério divulgue as mortes segundo os dois métodos, em vez de optar por um só.
É o que já fazem as secretarias de Saúde de estados como Pernambuco e Bahia.
Como a Folha mostrou, a pressão para mudar a metodologia partiu da cúpula militar à frente do Ministério da Saúde. A intenção foi pressionar técnicos a entregar uma plataforma com destaque para números menos impactantes.
A pasta planeja lançar em breve o novo site, mas ainda não se sabe quando isso acontecerá. O que é usado atualmente ficou fora do ar entre sexta (5) e sábado (6) e foi restabelecido com dados incompletos. A situação só foi normalizada na terça, após a decisão de Moraes.
Fonte: Folha de São Paulo